Utsuro no Hako:Volume1 2602ª vez

From Baka-Tsuki
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"Sou Aya Otonashi."


"—ah"

Bem naquele momento, uma imagem carmesim pisca na minha mente. É uma imagem que estava enterrada nas profundezas das minhas lembranças, mesmo eu tendo a visto por um instante logo agora.

E como se meu cérebro estivesse conectado àquela imagem por uma linha, o restante das minhas recordações da 2,601ª transferência escolar também são arrastadas à minha consciência.

Devo me elogiar por não ter gritado.

"Hum? Qual é o problema Hoshii? Você parece bem doente, está bem?"

Haruaki, que está sentado ao meu lado, está preocupado comigo.

Haruaki, que deveria ter sido atropelado por um caminhão, sorri para mim.

Um desconforto inevitável. Náusea. Um fluxo gigante de informação me sobrecarrega completamente, como se eu fosse sua presa e fosse totalmente consumida. Minha mente não consegue lidar com a sobrecarga de informação e fica severaente estressada.

As lembranças da última iteração acabaram de se conectar com minhas lembranças atuais.

A conexão é tão viva e clara—

"Mas enfim, a Aya-chan é muito linda. Confessarei meu amor à ela."

—por culpa do cadáver de Haruaki.

E agora ele se apaixona à primeira vista pela Aya Otonashi mais uma vez, mesmo que ela tenha o feito sofrer tão horrivelmente.

Olho para Otonashi-san e nossos olhos se encontram. Está me encarando. Com um sorriso desafiador, me encarando.

...reduzí-lo a um cadáver deveria supostamente me coagir a entregar minha caixa?

Se sim, seu plano foi efetivo demais. Me ameaçando ao mostrar-me um cadáver, implicando "Vou lhe matar"...E usando o cadáver do meu amigo, ela também me encurrala com a culpa. Percebo que na teoria nada disso é minha culpa; é tudo culpa da Otonashi-san. Mas enfrentado com um cadáver real, a teoria se espedaça e o instinto toma conta—minha vontade é facilmente quebrada.

Se eu pudesse, eu daria a caixa à ela nesse instante. Mas felizmente, não sei como.

...felizmente? Isso não está certo. Digo, já que esse ataque é tão efetivo, Otonashi-san definitivamente continuará.

Até quebrar minha força de vontade.

Otonashi-san desce da plataforma e se aproxima de mim.

Ela para ao meu lado.

Com os olhos focados à frente sem olhar para mim, ela murmura:

"Parece que você lembra."



Se as coisas continuarem assim eu quebrarei.

Me fiz de idiota e fugi da Otonashi-san, mesmo sabendo que é inútil.

Tenho que dar um jeito de elaborar uma contramedida enquanto a evito.

Foi por isso que—

"Já me contou tudo, Kazu?"

—consultei a pessoa mais inteligente que conheço, Daiya Oomine.

Daiya se escora em uma parede do corredor e está obviamente de mau humor—provavelmente porque minha explicação tomou todo o intervalo entre o primeiro e o segundo período.

"Então? O que quer que eu faça depois de me contar essa ideia para uma novel?"

Eu contei toda a história sem rodeios, incluindo o que eu fiquei sabendo pela Otonashi-san, sem omitir um único detalhe. Ainda assim, é o que é—não esperei mesmo que um realista como o Daiya acreditasse no meu conto, então o tornei em um cenário de uma novel.

"Queria saber o que o protagonista dessa história deveria fazer."

"Se pensarmos amplamente sobre suas opções, ele provavelmente deveria se opor àquela 'aluna transferida.'"

Naturalmente, eu sou o protagonista e a Otonashi-san é a aluna transferida nesse cenário.

Já que adotei a história desse jeito, Daiya notou que a aluna transferida é "Aya Otonashi". Mas ele apenas riu ironicamente e disse, "então ela foi o modelo." Ele parece confiante que nossa discussão é puramente hipotética.

"Mas...Não acho que o protagonista pode competir contra a aluna transferida."

"Acho que isso não é verdade no tempo presente."

O oponente é Aya Otonashi. Uma pessoa que vai tão longe a ponto de se transferir 2,602 vezes e até mesmo produzir cadáveres à fim de obter a caixa. Não acho que eu tenha qualquer chance de derrotá-la.

"Mas é possível que o protagonista obtenha poderes em um ponto mais além que seja equivalente aos poderes da aluna transferida,"

"Há—?"

Claro que consultei Daiya para achar uma solução. Mas minhas expectativas eram tão baixas, como achar uma agulha em um palheiro. Honestamente, não achei que ele pensaria em algo.

"Que reação é essa? Pois então, diga-me, o que faz a aluna transferida superior ao protagonista?"

"Hã? Bem—"

"Aah, não, é melhor não responder. Vai apenas me irritar com uma resposta totalmente estúpida."

...Já posso ficar irritado, certo?

"A diferença entre o protagonista e a aluna transferida é a diferença de informação. A aluna transferida pode usar toda esta diferença para manipular o protagonista como uma marionete. É simples. Tudo que ela precisa fazer é controlar o fluxo de informação e apenas dar ao protagonista informações que a beneficiem."

É...é isso mesmo. A Otonashi-san pode brincar comigo como quiser assim que eu esqueça o que está acontecendo.

"Por outro lado, se ele diminuir a distância entre seus níveis de informação—a principal razão pela qual não pode competir com ela—de algum jeito pode sair vitorioso. Ele só precisa se livrar dessa desvantagem."

"...mas isso é impossível!"

Daiya dá um risinho para minha resposta murmurada.

"Ei, você me disse que o protagonista pode recuperar as lembranças das iterações passadas."

"Sim."

"Então na próxima iteração, se ele manter as lembranças da iteração atual, porque sua encarnação atual recobrou as lembranças da iteração passada, ele será capaz de manter as lembranças da penúltima iteração. Certo?"

"......bom, acho que sim."

"Então se ele manter as lembranças da iteração anterior, ele pode também manter as lembranças das duas anteriores. Se pode manter as lembranças das duas anteriores, pode também manter das três anteriores."

"...e—? A aluna transferida também pode juntar informação durante esse tempo. A distância não pode ser diminuída. A Otonashi-sa—a aluna transferida já tem as lembranças de mais de 2,601 repetições, esqueceu? O que mudará se o protagonista obter as lembranças de duas, três vezes—"

"Repita o processo por 100,000 vezes."

"...hã?"

"Não há como lidar com o desequilíbrio das 2,601 vezes que já passaram. Então apenas tornamos essas 2,601 vezes irrelevantes. A diferença informacional entre 102,601 vezes e 100,000 vezes é apenas de uns 2% se usarmos aritmética simples. Não se pode mais chamar isso de diferença. Se o protagonista repetir o processo esse tanto de vezes, ele obterá os meios para opor a aluna transferida. Aí ele terá que tomar vantagem da informação que ganho e da exaustão da aluna transferida para enfraquecê-la, frustrá-la e fazê-la esquecer suas lembranças das iterações passadas."

"Eu—"

Eu deveria fazer algo assim?

".....mas ele nem sabe como recobrar suas lembranças só para começar."

Isso. Consegui recuperar minhas lembranças dessa vez, mas apenas por acaso.

"Você disse que o choque de ter visto um cadáver fez o protagonista recobrar suas lembranças, certo?"

"Foi o que assumi...eu acho."

Não consigo pensar em nada mais e meus instintos dizem que está correto.

Fui capaz de recobrar minhas lembranças porque acabei vendo o cadáver do Haruaki.

"Então é simples," Daiya afirma sem preocupação.

"O protagonista apenas precisa fazer cadáveres."

"—o quê?!"

Fico sem palavras.

"F-Fazer tal coisa—"

"Bem, ouça. Acho que certamente é irracional matar alguém. Um protagonista tão antiético apenas deixaria os leitores com desgosto. Falando de um modo geral, o protagonista tem de fazer algo com o mesmo impacto do que ver um cadáver."

"...isso poderia mesmo...funcionar."

"Em outras palavras o protagonista apenas precisa ser mais obstinado à possuir a caixa do que a aluna transferida."

O sinal soa. Daiya considera nossa conversa acabada e vira as costas.

"Voltarei para a sala. Você deve se apressar também, Kazu!"

"Sim..."

Mas não estou afim de voltar para a sala tão cedo e continuo imóvel. Daiya vai embora sem dar atenção alguma à mim.

Suspiro.

"...com certeza deve haver um jeito para eu manter minhas lembranças. Mas—"

—aguentar por 100,000 vezes? Pode ser possível na teoria mas não há como eu conseguir de verdade. Não há como um ser humano aguentar isso. É como se um inventor me dissesse para dirigir um carro com uma velocidade máxima de 20,000km/h. Mesmo que o carro possa ir à essa velocidade, eu corpo seria incapaz de aguentar a pressão e acabaria se desmantelando. Minha ente, não, a mente humana não é capaz de aguentar 100,000 repetições do mesmo dia.

Se a Otonashi-san é mesmo capaz de aguentar isso, ela é um caso especial. Por favor não me inclua na mesma categoria que esse monstro.

Mas esse é mesmo o único jeito de opor a Otonashi-san? Eu deveria sequer ir contra ela? Não seria melhor para nós dois se eu apenas jogasse a toalha?

Solto outro suspiro já que não consigo me decidir nem mesmo em algo tão simples.

Quando levanto a cabeça, decidindo voltar para a sala de aula...

"—ah"

Haruaki sai de trás de uma pilastra, me fazendo reflexivamente levantar minha voz.

"……Haruaki."

Ele escutou nossa conversa? Não, seu rosto parece muito sério. Afinal, estávamos apenas conversando sobre uma "história de ficção." Teoricamente falando, é claro.

Ele livremente começa a defender seu lado. "Francamente, já que sou se amigo, fico com ciúmes quando você se diverte com os outros e me deixa de lado, então acho que é completamente justo que eu me esconda e espione você. Está perdoado e esquecido."

Tirando seu tom de brincadeira, sua expressão continua séria o tempo todo.

"Pois então, Hoshii—"

Haruaki coça sua cabeça e pergunta.


"—quer tentar me matar?"


Minha respiração para.

Não faço ideia do que o fez dizer estas palavras totalmente desnorteantes.

Haruaki observa meu estado perplexo por um tempo. Não consigo nem piscar. Ele subitamente sorri complacentemente e, aparentemente incapaz de aguentar por mais tempo, cai na risada.

"Ah, não pode ser!—Isso é cruel, Haruaki! Não brinca comigo!"

"Ahaha! Não, não, nunca achei que sua reação seria tão séria...!! Inicrível! Hoshii, você é tão engraçado! É claro que estou brincando, é só brincadeira!"

Bom, faz sentido. Ninguém acreditaria que tal recorrência poderia mesmo acontecer.

"Certo...Uma piada... é claro que é só uma piada."

"Claro. Só pode ser uma piada—eu morrendo, que absurdo!"

Algo parece estranho em sua última afirmação.

"—Haruaki?"

"—Então? Como posso ajudá-lo?"

Ajudar? Do que o Haruaki está falando?

Haruaki está sério mais uma vez enquanto continua falando.

"Bem, já que minhas lembranças serão perdidas no próximo mundo mesmo, acho que o que posso fazer agora é limitado."

Aah, entendo—

Haruaki acredita na Sala da Rejeição.

Ele acredita na história que todo mundo acreditaria ser inventada.

"……Haruaki."

"Qual é o problema, Hoshii?"

"Err...aquilo era apenas um cenário ficcional que eu criei, sabia?"

Haruaki ri e diz de um modo pragmático:

"Isso é mentira, não é?"

"O qu—"

Não sei nem como começar a perguntar como ele descobriu.

Digo, nem mesmo eu conseguiria acreditar em uma história tão sem sentido mesmo se implorassem.

"Wahaha! Está impressionado pela profundidade da minha amizade? Ela me faz engolir até mesmo uma história tão ridícula sem hesitar!"

"Pois é."

Haruaki parece surpreso quando balanço a cabeça em confirmação.

"N-Não...não responda tão claraente! Vai me fazer corar!"

Ele timidamente coça o nariz.

"Só para sua informação, o Daiya também acredita que isso está mesmo acontecendo, sabia?"

"Hã?...não, não acho que acredite. Digo, estamos falando do rei realista, Daiya, esqueceu?"

Porém, agora que Haruaki mencionou, o Daiya parecia mesmo estar agindo diferente. Afinal, ele escolheu uma lugar especial para nossa conversa e sacrificou seu intervalo. Se ele achasse mesmo que isso é só um cenário de uma novel, ele teria me dispensado com um breve comentário como "Entediante. Não escreva isso."

"Certo, não acho que ele tenha aceitado 100% da sua história, mas acredite em mim—ele sabe que a verdade não é tão diferente!"

Parando para pensar, os comentários de Daiya estavam um pouco fora da realidade se deviam ser apenas críticas à uma novel. Ele claramente escolheu as respostas que o protagonista desejaria.

"Há uma falha na sua história para início de conversa, Hoshii. A Aya-chan, que claramente representa a aluna transferida, acabou de chegar hoje, não é? Você conversou com o Daiya durante o intervalo depois do primeiro período. Você não teve tempo o bastante para inventar tudo isso!"

"Ah—"

Isso é mesmo verdade.

"Acho que está dizendo a verdade, e não está delirando."

"...por quê?"

"Meio que se encaixa bem demais quando tudo se junta para ser só delírio seu, não acha? Não há como você ter uma imaginação tão fértil, Hoshii."

"Que rude..."

"Bom, mesmo que você fosse um pouco mais brilhante e pudesse inventar algo assim em tão pouco tempo; eu ainda acreditaria em você."

"...por quê?"

"Porque somos amigos, não somos?"

Nossa, o que esse cara está falando...

Digo, como eu deveria...não ficar envergonhado quando ele fala desse jeito?



Haruaki faz uma cara séria e enche a boca com batata frita.

"Entendi. Então a Aya-chan...não, Aya Otonashi pode ter me matado..."

Acabamos indo ao McDonald's, por sugestão do Haruaki. Somos dois estudantes de uniformes que saíram da escola mais cedo fingindo estarem passando mal, comendo em plena luz do dia no McDonald's. Não consigo evitar perceber os olhares das pessoas nos julgando e sinto vontade de sair correndo.

"Imagino se a Otonashi-san ligaria se estivesse no McDonald's em seu uniforme escolar durante o horário de aula."

"Bom, acho que no caso da Aya Otonashi, ela não ligaria."

O Haruaki agora sabe que pode ter sido morto pela garota pela qual se apaixonou à primeira vista, então ele diz seu nome com hostilidade.

"Em outras palavras, ela se adaptou à essa situação ao longo de mais de 2,000 iterações."

A Otonashi-san já está acostumada com tudo sendo declarado "vazio" após cada iteração. Com certeza ela não se irritaria mais com qualquer coisa dentro da Sala da Rejeição.

A Otonashi-san se adaptou à uma situação anormal. Dá mesmo para dizer que a personalidade dela ainda é normal, dessa Otonashi-san que está tentando me matar?


"Isso supostamente deveria ser uma tentativa de fuga?"


Meu coração para.

Ouvir a voz da pessoa na qual pensava tão de repente... Não consigo me virar e encarar o rosto da dona da voz atrás de mim. Estou congelado.

Como ela nos achou? Não contei nem ao Daiya.

A Otonashi-san dá a volta e para na minha frente. Ainda não consigo levantar minha cabeça.

"Deixe-me lhe dizer algo, Hoshino," ela diz com um sorriso no rosto. "Este é meu 2,602º 2 de Março. Passei todo esse tempo com colegas que não mudaram nem um pouco já que não mantém nenhuma lembrança e não sabem sobre os loops temporais."

Ela calmamente repousa sua mão na mesa. Só isso já faz todo meu corpo enrijecer.

"Normalmente, pessoas mudam, e suas crenças também. Por isso não é tão fácil prever suas ações. Porém, é ridiculamente fácil entender suas ações já que estão presos em um impasse e não podem mudar. É ainda mais fácil já que é sempre o mesmo 2 de Março. Decorei até mesmo o padrão de suas conversas. Hoshino, posso facilmente prever o alcance que as ações de um colegial inofensivo como você têm."

Estou tendo uma experiência em primeira mão com a "diferença de informação" que o Daiya mencionou. Eu vagamente pensei que ele estava apenas dizendo sobre informação envolvendo a Sala da Rejeição ou a caixa. Mas não é só isso. A informação mais crucial está relacionada ao "Kazuki Hoshino"—próprio eu. E a informação que preciso obter está relacionada à "Aya Otonashi". Foi isso que o Daiya quis dizer desde o início. Por isso ele disse que a diferença entra a nossa informação diminuiría após mais recorrências.

"Entendeu? Não pode escapar de mim, Hoshino. Você está completamente dentro do meu alcance. Posso facilmente esmagá-lo. Mas se eu fizer isso, também esmagarei o precioso objeto que você tem. Só por isso você está vido. Entendeu? Então é melhor não me irritar."

Otonashi-san toma minha mão.

"Fique quieto e me siga. E me obedeça sem reclamar."

Ela não está segurando minha mão com força. Se eu tentar, consigo soltá-la facilmente. Mas...posso mesmo fazer isso?...sem chance. Já fui dominado pela Aya Otonashi. Sei que sou miserável. Mas apenas não consigo...desafiá-la. Não sei como.

E tirando isso—tirando o fato de não ter meios para desafiá-la—minha mão é liberta do aperto da Otonashi-san.

"O que está fazendo," Diz a Otonashi-san. Não fui capaz de me soltar. Por isso suas palavras hostis não são para mim.

"O que estou fazendo, você perguntou?...ha!"

Suas palavras são para o Haruaki, que separou nossas mãos.

"Não entregarei o Hoshii à você! Não consegue entender direito uma coisa tão simples assim? Você é retardada?"

As palavras do Haruaki são infantis, mas seu rosto ficou rígido. É um blefe total. Ele normalmente nunca trataria alguém assim.

Naturalmente, a Otonashi-san não cede à sua provocação.

"Não é isso que estou perguntando. Usui, parece que é você quem não está usando seu cérebro. Suas ações são fúteis. Sem sentido. Parece que decidiu salvar o Hoshino, mas isso é meramente um sonho fraco e momentâneo que está prestes a desaparecer. Da próxima vez, você terá perdido toda essa determinação e voltará correndo para mim de novo, se confessando para mim em vez de lutar contra mim."

Haruaki hesita completamente após ouvir estas palavras. Ele sabe que ela está certa. Se o mundo resetar de novo, o Haruaki esquecerá de nossas conversas durante essa iteração. Mesmo que ele esteja bem hostil em relação à ela agora, irá se apaixonar à primeira vista por ela de novo, e se confessará de novo. O Haruaki está totalmente encurralado.

Mas mesmo sendo confrontado com a dura e inescapável verdade, o Haruaki aperta seus punhos.

"Não, você é quem ainda não está usando o cérebro, Otonashi! Posso mesmo voltar ao meu 'eu inconsciente' toda vez! Acho que não serei capaz de manter minhas lembranças e também não sou brilhante como o Daiya. Mas sabe de uma coisa? Eu confio bastante em mim mesmo."

"Não estou entendendo. O que esstá tentando concluir?"

"Diga, Otonashi. Eu estou mesmo em um ponto morto e não vou mudar, certo?"

"É, e por isso que não tem força alguma."

"Ha! É o contrário, Otonashi! Se eu não vou mesmo mudar, posso ter garantia sobre o eu das iterações futuras. Afinal, eles serão exatamente a mesma pessoa que sou agora. Posso prever seus comportamentos sem erro! Esses 'eu' acreditarão no Hoshii sempre que ele explicar a situação, e o ajudarão sempre que isso acontecer também. Não há um mundo no qual que abandonaria o Hoshii. Escute e grave bem isso, Otonashi—"

Ele aponta à Otonashi-san.

"—Se fizer do Kazuki Hoshino seu inimigo, também comprará briga com um imortal!"

Para ser honesto, sua postura não está nada firme. Ele está sob pressão, está blefando e suas mãos estão tremendo. Obviamente está nervoso. Frases legais não combinam nada com ele, não é nem engraçado—especialmente já que ele está sempre de palhaçada na frente de todo mundo.

Mas suas palavras definitivamente esquentaram meu coração.

Digo, não há um mínimo tom de dúvida na sua voz. Nada do seu tom exageradamente dramático de sempre também. O Haruaki está falando de uma maneira completamente firme.

"——"

Claro que a Otonashi-san não está nem um pouco perturbada pela sua postura instável. Mas ela não o contraria imediatamente. Ela fecha sua boca por alguns segundos, descontente.

"...Você me faz parecer o vilão. Você não sabe que quem o arrastou para essa Sala da Rejeição foi o Kazuki Hoshino?"

As palavras da Otonashi-san são precisas e afiadas. O Haruaki sofre com cada uma delas, mas ainda assim—

"Não duvidarei do meu aliado por causa disso!"

O Haruaki não muda sua opinião. Se recusa à desviar seu olhar da Otonashi-san mesmo estando aterrorizado.

Isso não é nada bom. Digo, o oponente é a Aya Otonashi! Não é ela quem sofrerá se o Haruaki a declarar um inimigo eterno. O Haruaki que estará na mira. A garota pela qual ele se apaixonará de novo e de novo o tratará com hostilidade seu uma razão aparente. A partir de agora, o Haruaki sofrerá em cada iteração.

Em contraste, ela não se estressará nem um pouco com a oposição do Haruaki.

Porém:

"Perdi meu interesse."

É a Otonashi-san quem desvia seu olhar primeiro e se vira.

"Todas suas ações se tornarão inúteis de qualquer jeito quando a próxima iteração começar."

Ela cospe essas palavras e sai.

Se qualquer um sem ser a Otonashi-san dissesse algo assim, poderia soar um pouco rude. Mas vindo dela, não soa nem um pouco fora do normal. Em primeiro lugar, como a Otonashi-san pode perder quando nem mesmo liga para ele?

Assim, ela simplesmente deu voz à seus pensamentos. Ela concluíu que seria mais conveniente lidar comigo em uma situação mais vantajosa no futuro.

A Otonashi-san não sente nada por nós. Claro que ela não nos teme, mas não se irrita conosco e também não nos xinga.

Então me pergunto—por quê?

Não, é apenas minha imaginação. Um chute errado. Um mal-entendido. Mas mesmo assim, sério, honestamente, apenas por um instante—

Ela não parecia um pouco—desapontada?

"Ei...Hoshii,"

O Haruaki ainda está encarando a porta automática pela qual a Otonashi-san acabou de passar.

"Acha que vou ser morto?"

Sem chance...é quase o que respondo. Mas percebo que o que aconteceu da última vez pode facilmente acontecer de novo, então fico quieto.



Como esperado, estava chovendo no 3 de Março da 2,602ª iteração. Fui para a escola um pouco mais cedo do que da última vez e evitei o lugar onde o acidente aconteceu, apesar de que tive que tomar um desvio. Fiz isso para repelir o ataque da Otonashi-san...ou, para falar a verdade, eu simplesmente não queria ver aquela cena de novo.

O Daiya já está presente quando chego na sala de aula. Ele se aproxima assim que me vê.

"O que foi, Daiya?"

Por algum motivo o Daiya não responde imediatamente. Ele olha fundo nos meus olhos. Escondendo seus sentimentos tão bem quanto sempre, mas ainda assim consigo deduzir que algo estranho está acontecendo.

"......sobre a novel que conversamos ontem."

O Daiya faz questão de falar indiferentemente. Ele se refere à "novel", mas na verdade está falando sobre "minha situação atual".

"Tem algo me incomodando. Por que a aluna transferida não perde suas lembranças como o protagonista?"

Não sei responder sua pergunta, porque nem entendo o motivo dessa conversa.

"Mesmo o protagonista—o criador da Sala da Rejeição—perde suas lembranças. Então mesmo se assumirmos que a aluna transferida possuí algum pode especial, não seria muito conveniente para ela recobrar automaticamente suas lembranças das recorrências? Acho que seria melhor se ambos o protagonista e a aluna transferida fossem capaz de manter suas lembranças através do mesmo metódo."

"...talavez você tenha razão."

Concordo sem pensar muito sobre o significado real do que ele está falando. Talvez eu não seja capaz de entender completamente suas palavras porque ele ainda está retratando isso como parte de uma "novel".

"O protagonista conseguiu manter suas lembranças porque viu um cadáver, certo?"

"...acho que sim."

"O cadáver foi o resultado de um acidente de caminhão, certo? Não tem como a aluna transferida, que já viveu o mesmo dia 2,601 vezes, não saber desse caminhão, certo? Se a aluna transferida estivesse envolvida com o acidente, então foi sem dúvidas intencional. Por isso você disse que o 'amigo do protagonista' 'foi morto'."

Concordo com a cabeça.

"Mas algo me incomodou nesse cenário."

"Por quê? Estou errado?"

"Não, não mesmo. Com certeza é um ataque efetivo contra o protagonista...mas apenas se assumirmos que ele irá manter suas lembranças. Não há sentido em um ataque bem-sucedido se o protagonista vai esquecer logo depois."

"Não entendo o que você está tentando dizer..."

"O objetivo da aluna transferida é roubar a caixa do protagonista, certo?"

"É."

Tente pensar da perspectiva da aluna transferida. A aluna transferida finalmente encontra a pessoa que ela esteve procurando—o protagonista. Mesmo a aluna transferida podendo ficar quieta, ela abertamente explica a situação para o protagonista. Um oponente que não sabe de nada contra um oponente que foi atacado e por isso está em guarda—de qual seria mais fácil roubar a caixa? Claro que seria do que não sabe de nada. Então por que acha que a aluna transferida explicou a situação ao protagonista?"

"Err...porque a aluna transferida pensou que o protagonista esqueceria?"

"Isso. Ela concluíu que não importaria. Ela ter dito tudo à ele provavelmente foi só um jeito de matar tempo para ela; pode-se chamar isso de negligência."

"Mas o acidente só poderia ocorrer intencionalmente, certo? Então deveria ser um ataque à mim mesmo..."

"Acho que foi intencional. Mas tente pensar assim: a aluna transferida não previu que o protagonista veria o cadáver."

Em outras palavras, o objetivo do acidente não era me atacar?

Reflito em suas palavras mais uma vez.

"Ah—"

Rapidamente olhei pela sala. A aluna transferida—Aya Otonashi—não está. Com certeza ainda está no local do acidente.

"Sem chance...isso é totalmente anormal!"

"Claro. Não tem como uma pessoa que se adaptou à 2,602 loops continuar completamente sã."

Aya Otonashi matou alguém.

Ela não matou para me atacar, mas para manter suas próprias lembranças.

Eu lembro. Realmente não queria, mas lembro. Esse acidente não aconteceu pela primeira vez durante o 2,601º loop. Talvez ela tenha o causado durante cada um dos outros 2,600 loops.

Então ela continuará matando pessoas à fim de "transferir"?

Serei forçado à assistir silenciosamente seus assassinatos?

O Haruaki será morto de novo dessa vez?

"—Haruaki!"

"Hum? O que foi, Hoshii?"

O Haruaki acabou de entrar na sala e está parado em frente a porta.

O que isso significa? O Haruaki não é o alvo?...certo, não é necessário que ele seja o cadáver, não é?

"Bem, chega da sua novel, Kazu...vamos ao ponto," o Daiya continua enquanto ignora o Haruaki.

"Parece que houve um acidente há pouco."

O Daiya respira profundamente e diz, "A Aya Otonashi foi atropelada por um caminhão."

O quê—?


Aah, entendi.

Mesmo que ela seja o alvo, ela não liga.



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