Suzumiya Haruhi:Volume1 Capítulo6br

From Baka-Tsuki
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Capítulo 6


Eu achei, assim como ontem, uma outra carta dentro do meu armário de sapatos. O que há com essas pessoas que deixam bilhetes pelos armários de sapatos nestes dias?

Eu tive uma sensação diferente desta vez, de qualquer forma. A carta não estava dobrada e não era anônima como a da última vez. Atrás do envelope - que se parecia com aqueles envelopes elegantes que vem em revistas de shoujo manga com questionários e coisas assim - estava escrito claramente um nome. Se meus olhos não me enganavam, eu estava certo de qual nome estava escrito ali.

Mikuru Asahina.

Instantaneamente coloquei o envelope no bolso da jaqueta e corri para o banheiro masculino para o abrir. Havia um pedaço de papel com símbolos sorridentes desenhados por toda sua superfície, e estava escrito o seguinte:

Estarei esperando você na sala do clube durante o intervalo do almoço.

Mikuru-chan.

Depois dos eventos ocorridos ontem, minha visão da vida, do mundo, e da própria realidade deu uma pirueta de 360 graus como um acrobata.

Eu nunca mais queria passar por situações de risco de vida novamente.

Mesmo não podendo acabar com tudo isso. No final, era Asahina que estava me convidando desta vez! Mesmo não tendo evidência nenhuma que provasse que a carta era dela, nunca duvidei de sua autenticidade, pois ela parecia ser o tipo de pessoa que se usa dessas indiretas. E mais, a imagem dela segurando a caneta e escrevendo excitadamente um pedaço de papel bonitinho, realmente se ajustava a Asahina. Alem disso, no horário de almoço, Nagato estava por perto e, se algo acontecesse, ela estaria lá para me salvar.

Por favor, não me chamem de covarde. No final, sou apenas um colegial comum.


Depois da quarta aula, fui cercado por: Taniguchi, que me olhava com aqueles olhos cheios de significado, por Kunikida, que carregava sua lancheira, me convidando para ir comer com eles; e por Haruhi, pedindo para ir com ela até a secretaria para investigar a verdade por trás da partida de Asahina. Sem nem ao menos comer nada, fui de uma vez até a sala do clube.

Era apenas maio, mesmo assim o sol brilhava com a força do verão. O sol era como uma fogueira colossal, irradiando alegremente sua energia em direção a Terra. Quando o verão finalmente chegasse o Japão se tornaria uma sauna natural. Podia sentir o suor escorrendo da minha roupa de baixo enquanto andava.

Em três minutos, cheguei ao clube. Bati na porta ao chegar.

“Por favor, entre.”

Era a voz de Asahina, sem duvida nenhuma em relação a isso. Certo, posso relaxar e entrar.

Quando entrei, não encontrei Nagato, e para minha surpresa, nem Asahina.

Em frente a mim estava uma garota de cabelos longos, apoiada no parapeito da janela, olhando para o pátio da escola. Ela vestia uma blusa branca e uma minissaia preta, enquanto em seus pés se podia ver um par de sapatos feitos para os visitantes da escola.

Quando ela me viu, andou em direção a mim, e segurou minhas mãos afetuosamente.

“Kyon-kun... já faz algum tempo.”

Ela não era Asahina, mesmo se parecendo muito com ela. Tanto que facilmente alguém a confundiria ela e a própria Asahina. Para ser honesto, até eu podia pensar que era ela.

Mas assim mesmo não era Asahina. A Asahina que conhecia não era tão alta, e seu rosto não era tão maduro, sem mencionar que os seios debaixo de sua blusa não podiam ter crescido um terço do dia para a noite.

Não importa o quanto olhasse, eu tinha certeza que a pessoa em minha frente, que sorria enquanto segurava as minhas mãos, tinha seus vinte e tantos anos, dando uma impressão completamente diferente da garota com aparência de estudante do fundamental que era Asahina. Mas como diabos essa mulher se parecia tanto com ela?

“Desculpe-me...”

Subitamente pensei em um motivo.

“Você é a... irmã de Asahina-san?”

Ela pareceu surpresa por alguns segundos, então sorriu e piscou os olhos, abanando os ombros. Até mesmo o sorriso era igual.

“Hee hee, eu sou eu.” - ela disse.

“Sou Mikuru Asahina. Mas venho de uma linha temporal mais adiantada... sempre quis me encontrar com você.”

Devo ter parecido muito estúpido naquela hora. Mas, facilmente podia aceitar Asahina dizendo ser sua versão do futuro. Olhando para a beldade em minha frente, percebi quão bonita ela ficaria quando crescesse. E mais, ela era mais alta, a fazendo ainda mais sexy. Nunca pensei que ela pudesse se tornar tão bela.

“Oh, você ainda não acredita em mim?”

Asahina em sua roupa de secretaria disse maliciosamente.

“Então vou te mostrar a prova!”

Ela começara a desabotoar a blusa. Quando abriu o segundo botão, seu busto foi revelado para a minha surpresa.

“Olhe, você pode ver a pinta em forma de estrela? Não foi colada! Quer tocar nela?”

Havia uma marca em forma de estrela em seu seio esquerdo, um holofote atrativo em sua pele alva, radiando charme.

“Então, acredita agora?”

Como poderia dizer isso? Eu nunca havia visto que Asahina tinha uma pinta no peito. Mesmo sendo forçado a ver ela se trocar enquanto se vestia de bunny-gal há tempos atrás, não fiquei tão concentrado a ponto de perceber esse pequeno detalhe. Enquanto pensava nisso, a atraente e madura Asahina falou.

“Isso é estranho. Se você não tivesse me dito sobre essa pinta, não teria percebido sozinha.”

Asahina balançou confusa a cabeça, e então, como se tivesse acabado de perceber algo, seus olhos se arregalaram e ela corou furiosamente.

"Eh... a não, eu apenas... c... certo! Nós ainda não... o que eu deveria fazer?"

Asahina colocou suas mãos sobre o rosto e balançou freneticamente, os botões de sua blusa continuavam abertos.

"Entendi errado... me... desculpe-me, esqueça o que eu acabei de dizer!"

Era mas fácil falar do que fazer. Oh, e você poderia abotoar a blusa novamente? Eu realmente não sei mais para onde olhar!

"Certo, por hora, acredito em você. Na verdade, agora estou propenso em acreditar em qualquer coisa."

"Perdão, o que disse?"

"Ah, nada. Só falando sozinho."

Aquela Asahina de idade desconhecida continuava segurando seu rosto avermelhado, até perceber para onde eu estava olhando, e rapidamente fechou os botões. Após se sentar, ela pigarreou seco, e disse.

"Você realmente acredita que vim do futuro desse plano temporal?"

"Claro. Mas se esse é o caso, significa que temos duas Asahinas nesse mundo?"

"Sim, o meu eu do passado... Agora mesmo, está sentada com suas colegas lanchando na sala."

"Asahina sabe que você está aqui?"

"Não, no final das contas, ela é o meu passado."

Entendo.

"Como tinha que lhe dizer algo, implorei aos meus superiores que me deixassem vir a esse quadro temporal. Ah sim, eu pedi a Nagato que nos deixasse sozinhos por enquanto."

Como era Nagato, acredito que ela nem tenha se abalado nem um pouco ao ver essa versão de Asahina.

"... você sabe quem Nagato-san realmente é?"

"Perdão, mas essa é uma informação confidencial. Oh, acho que faz muito tempo que não digo isso."

"Ouvi você dizer isso há poucos dias atrás."

"Você está certo." - ela disse enquanto batia levemente na cabeça colocando a língua para fora. Certamente isso parece ser algo que a Asahina faria.

Repentinamente ela começou a me olhar seriamente.

“Não posso ficar muito tempo aqui, então vou direto ao ponto.”

Diga o que tem que dizer logo!

“Você já ouviu falar da Branca de Neve?”

Eu olhei para a um-pouco-mais-alta Asahina. Suas pupilas negras pareciam estar um pouco úmidas.

“Bem, sim...”

“Não importa por quais situações complicadas você passe de agora em diante, espero que se lembre dessa historia.”

“Você diz aquela com os sete anões, a bruxa malvada, e a maça envenenada?”

“Sim, a historia da Branca de Neve.”

“Eu já passei por uma historia complicada ontem.”

“Não... será bem mais sério que isso. Não posso dizer detalhes, mas posso afirmar que Suzumiya Haruhi estará ao seu lado quando acontecer.”

Haruhi? Estará comigo? Você diz que eu e ela nos envolveremos em algo problemático? Quando? Onde?

“Talvez Suzumiya-san não ache isso um incomodo... Mas para você e para nós, será um problema complicado.”

“Você não pode me dizer os detalhes... pode?”

“Desculpe, mas só posso dar pistas a você. É tudo que posso fazer.”

A adulta Asahina estava querendo se desculpar tanto, que chegava próxima as lagrimas. Sim, essa é a expressão que a nossa Asahina geralmente mostra.

“Você diz a historia da Branca de Neve?”

“Sim.”

“Vou me lembrar disso.”

Após me ver concordar, Asahina disse que tinha um pouco de tempo sobrando, então caminhou nostalgicamente pelo clube, acariciando preciosamente a fantasia de maid que estava pendurada no armário.

“Eu costumava vestir isso freqüentemente. Agora, definitivamente, eu não ousaria colocar isso.”

“Você parece estar fazendo um cosplay de secretaria agora.”

“Hee hee, como não entro em meu uniforme, tenho que me vestir como professora.”

Algumas pessoas nascem para usar fantasias.

“Falando nisso, o que mais Haruhi fez você vestir?”

“Não vou te falar, é embaraçoso demais. Alem do mais, creio que você vai descobrir logo, certo?”

Asahina caminhou em direção ao meu rosto. Descobri que seus olhos estavam anormalmente úmidos e seu rosto um tanto vermelho.

“Então, estou indo agora!”

Asahina olhou para mim, querendo continuar, porem decidiu parar. A vendo tremer e parecer desejar algo, talvez eu a devesse beijá-la. Quando estava prestes a abraçá-la, ela recuou.

Asahina se virou com leveza, e falou;

“Finalmente, eu tenho mais um pedido. Por favor, não se aproxime muito de mim.”

Ela disse aquilo entrecortado por um fraco suspiro.

Eu rapidamente exclamei a ela, que corria em direção a porta; “Tenho uma pergunta para você!”

Asahina parou justo quando estava prestes a abrir a porta.

“Asahina-san, quantos anos você tem agora?”

Ela virou balançando seus cabelos, então deu um sorriso sedutor.

“Informação confidencial~”


A porta se fechou. Provavelmente não fazia sentido ir atrás dela.

Wow, eu mal podia acreditar que Asahina se tornaria tão bonita quando crescesse. Quando subitamente percebi que a primeira coisa que ela havia dito. “Kyon-kun... já faz algum tempo.” Isso só podia significar que ela não havia me visto por muito tempo.

“Sim, isso deve fazer sentido.”

A Asahina do futuro provavelmente deve ter retornado ao seu futuro não tão distante, e gasto alguns anos por lá, antes de ter me encontrado nessa época novamente.

Mas quanto tempo foi para ela? Pelo quanto ela havia crescido, eu dou uns cinco anos... ou até mesmo três! As garotas mudam muito quando saem do colegial. Com minha prima foi assim. Quando estava no colegial, sempre fora uma quieta colegial que não atraia atenção alguma. Então quando entrou na universidade, ela se metamorfoseou de uma horrenda lagarta para uma bela borboleta. Mesmo que ela tenha crescido, fiquei ainda mais confuso pela idade real de Asahina; eu não acho que ela tenha 17 realmente!

Cara, que fome, acho que vou voltar.

“ ... ”

Então, Yuki Nagato entrou com sua bem preservada face gélida, mas ela não estava usando óculos hoje, seu olhar nu pousou sobre mim.

“Ei, você viu alguém parecida com Asahina passando por aqui?” - disse em um tom de brincadeira.

“Eu já havia visto o clone de diferencial temporal de Mikuru Asahina esta manhã.”

Nagato sentou-se silenciosamente, colocou o livro sobre a mesa e começou a ler.

"Ela não está mais aqui, e já saiu desse quadro temporal."

"Você pode viajar pelo tempo também? Com essa coisa de Entidade de Dados?"

"Eu não posso. Porém, o movimento temporal não é uma coisa tão difícil quanto se pode pensar; apenas que os humanos ainda não compreenderam seus princípios básicos. Tempo é como o espaço; se movimentar por ele é muito simples."

"Você pode me ensinar?"

"Esse conceito não pode ser explicado em palavras, você não entenderia nem se eu lhe explicasse."

"Então é assim?"

"Sim."

"É uma pena então."

"Uma pena."

Não fazia sentido dialogar com um personagem estático. Então decidi voltar à sala. Será que eu ainda tinha um tempo para almoçar?

"Nagato-san, obrigado por ontem."

Sua expressão estática se moveu levemente.

"Não há necessidade de agradecimentos. As ações de Ryouko Asakura são de minha responsabilidade; Minha supervisão foi muito descuidada."

Seu cabelo balançou-se lentamente.

Ela estava tentando se curvar a pedir desculpas?

"Você definitivamente fica melhor sem os óculos."

Ela não respondeu.

Eu queria correr de volta a sala e comer, mas Haruhi me esperava na porta, e meus planos para o almoço foram jogados pela janela. Isso pode ser o destino? Parece que cheguei a um ponto que posso ver através de todo o karma [1].

1-[Nota do tradutor: as religiões utilizam o termo Karma para expressar um conjunto de ações dos Homens e suas conseqüências].

Esperando impacientemente no corredor, Haruhi gritou em um tom irritado.

"Aonde você foi? Achei que ia voltar antes, eu nem comi porque fiquei esperando por você todo esse tempo!"

Ela não parecia tão brava assim, simplesmente soava como aquelas amigas de infância que gritam para esconder a sua vergonha.

"Não fique parado ai que nem um idiota! Me siga!"

Haruhi me deu uma chave de braço e me puxou para uma escadaria escura.

Cara, estou realmente com fome!

"Eu perguntei ao Okabe na sala dos funcionários. Os professores só souberam da transferência esta manhã. Bem cedo, alguém dizendo ser o pai de Asakura, apareceu dizendo que eles deveriam se mudar devido a uma emergência. E você sabe pra onde eles estavam indo? Canadá! Como isso é possível? Tem algo muito errado ai!"

"Sério?"

"No final das contas, eu disse que era uma boa amiga da Asakura e queria saber se havia como contatar ela no Canadá."

Me poupe, você mal falava com ela quando estava por perto.

"Você sabe o que os professores disseram? Que eles também não sabiam. Normalmente quando alguém está de mudança, eles geralmente não deixam os detalhes para contato? Há alguma coisa estranha aqui."

"Não, não há!"

"Então, pedi pelo antigo endereço de Ryouko Asakura antes dela se mudar. Eu vou lá dar uma olhada depois da aula. Talvez nós possamos achar algo por lá."

Essa garota nunca ouve o que os outros dizem, como sempre.

Esquece, eu não vou conseguir detê-la. No final quem vai perder tempo vai ser Haruhi, não eu.

"E você vai comigo!"

"Por que!?"

Haruhi levantou os ombros, e como um dragão inspirando antes de soltar seu sopro de fogo, ela gritou em um volume que toda a escola poderia ouvir.

"PORQUE VOCÊ É UM MEMBRO DA BRIGADA SOS!!!"


Incomodado com as ordens de Haruhi, eu recuei freneticamente. Fui para a sala do clube para falar a Nagato que tanto eu quanto Haruhi não estaríamos no clube hoje, e ficava a cargo dela passar a mensagem para Koizumi e Asahina quando eles chegassem. Não sabia se essa alien silenciosa faria as coisas ficarem ainda mais complicadas, então só pra ter certeza, peguei uma caneta e escrevi no verso em um dos panfletos da Brigada SOS.

‘Não haverão atividades da Brigada SOS hoje. – Haruhi.”

E colei o bilhete na porta.

Deixando Koizumi de lado, pelo menos Asahina poderia economizar tempo em vestir a roupa de maid.

Graças a isso o sinal para a quinta tocou antes que pudesse comer algo. Então teria de esperar pelo próximo intervalo para me alimentar.


Estaria mentindo se dissesse que nunca quis andar lado a lado com uma garota depois da aula que nem em uma dessas novelas. Mas agora que o sonho se tornara realidade, estou bem longe de estar feliz. Então, o que está acontecendo?

“Você disse alguma coisa?”

Haruhi perguntou enquanto andava a minha esquerda, com passos largos e carregando um papel para anotações. Automaticamente interpretei a sua pergunta como ”Tem algum problema?”

“Nada, nada mesmo.”

Descemos à ladeira e seguimos a linha de trem. Um pouco mais, e estaríamos na estação de Koyouen.

Percebi que estávamos chegando perto da casa da Nagato. Nunca pensei que Haruhi estava andando também para aquele lugar. Então chegamos em frente a um familiar condomínio de apartamentos novos em folha.

“Asakura vivia no apartamento 505.”

“Eu nem imaginava isso.”

“O que você quer dizer com isso?”

“Não, nada. Ah certo, como você espera entrar? O portão está trancado.”

Eu apontei para o teclado com números ao lado do interfone e disse.

“Você precisa digitar a senha certa para abrir. Você sabe ela?”

“Não, mas vamos precisar perdurar em uma batalha prolongada nesta situação.”

O que você está esperando afinal? Quando estava pensando o quanto aquilo poderia demorar, nós acabamos não precisando esperar muito. Naquela hora uma senhora de meia idade abriu o portão por dentro, aparentemente saindo para ir a uma confeitaria. Ela nos olhou de maneira questionadora e foi embora. Haruhi correu para manter o portão aberto antes que ele se trancasse.

Isso não me parecia nem um pouco esperto.

“Se apresse!”

Então fui arrastado para dentro do hall de entrada, e subimos pelo elevador, que convenientemente estava no térreo. Era da etiqueta básica olhar silenciosamente para o número dos andares enquanto se estava no elevador.

“Aquela Asakura...”

Mas Haruhi não parecia reconhecer a existência de algo chamado etiqueta.

“... ainda há muitas outras coisas estranhas em relação a ela. Aparentemente Asakura não estudou o fundamental em nenhuma escola local.”

Bem, é claro.

“Pesquisei um pouco e descobri que ela foi transferida de outra cidade para cá. Isso é muito suspeito! A Escola média do Norte não é famosa e nem nada, apenas uma escola comum de ensino médio. Porque alguém gastaria tanto esforço para vir de outra cidade estudar aqui?”

“Entendo.”

“Mesmo que ela more perto da escola, e um desses apartamentos tenha sido comprado com dinheiro e não seja alugado. Seu preço deve ser insanamente alto. Ela estava indo de trem para sua escola antiga em outra cidade o tempo todo?”

“Já disse que não sei.”

“Parece que temos que descobrir quando Asakura começou a morar aqui.”

O elevador parou no quinto andar. Olhamos silenciosos para a porta do apartamento 505. A placa de nome ao lado da porta fora removida, indicando que o quarto estava vazio. Haruhi girou a maçaneta, e como esperado, estava trancado.

Ela cruzou os braços, pensando em como entrar para investigar, enquanto eu estava parado tentando arduamente não bocejar. Isso era uma completa perda de tempo.

“Vamos achar o zelador!”

“Não acho que ele vai nos dar a chave.”

“Não, estou pensando se ele vai nos responder quando Asakura veio para cá.”

“Esqueça, vamos pra casa! O que podemos fazer, mesmo se soubéssemos?”

“Não.”

Pegamos o elevador e voltamos ao térreo, se dirigindo a recepção na entrada. Não parecia haver ninguém atrás da placa de vidro, então quando apertamos a campainha, um pequeno senhor de cabelos brancos apareceu vagarosamente.

Haruhi começara a o bombardear com perguntas, antes mesmo que o velho conseguisse falar.

“Desculpe-me, mas somos amigos de Asakura-san. Ela disse que ia se mudar subitamente, e não nos deixou seu novo endereço, então não sabemos como entrar em contato. Você poderia, por favor, nos dizer para onde ela foi? E, se fosse possível falar quando ela veio morar aqui?”

Fiquei boquiaberto em saber como Haruhi podia usar uma linguagem normal e educada, mas o homem idoso parecia ter problemas em ouvir, pois ficava respondendo com; “Como?”, “Pode repetir?”, e coisas assim. Deixando isso de lado, Haruhi descobriu que o homem estava igualmente surpreso com a partida de Asakura. (Eu nem vi a mudança chegar, e toda a mobília lá dentro já tinha sumido. Isso me dá calafrios). E que Asakura havia se mudado para lá há três anos atrás. (Eu me lembro da pequena senhorita me dando uma caixa de doces naquele dia!). E que ao invés de pagar aluguel, o apartamento parecia ter sido pago de uma só vez, em dinheiro. (Acho que eles são muito ricos!). Wow, desse jeito você pode ser uma detetive!

O velho parecia estar contente de poder conversar com uma jovem como Haruhi.

“Pensando bem, acho que vi a jovem senhorita diversas vezes, mas não lembro de ter visto os pais dela.”

“Lembro-me da pequena dama chamada Ryouko. É um nome bem elegante para uma garota.”

“Queria pelo menos ter me despedido... é mesmo uma pena. Oh sim, você é bem bonitinha também!”

Quando o homem começou a falar coisas daquele naipe, Haruhi percebeu que ela não conseguiria tirar mais nenhuma informação dele. Então decidiu se curvar educadamente e dizer; “Muito obrigada pela sua ajuda.”.

Ela me forçou a sair. Não havia necessidade daquilo, pois eu já estava preparado para segui-la e deixar o condomínio.

“Ei garoto! Aquela menina vai se transformar em uma bela dama, fique certo de não a deixar escapar!”

Obviamente o velho estava falando coisas sem sentido. Eu fiquei preocupado com o tipo de reação terrível que Haruhi, que teve que ouvir tudo aquilo, poderia ter. Continuamos nos movimentando em silêncio para frente, e permanecemos assim. A poucos passos do hall, trombamos com Nagato, carregando uma sacola de plástico de alguma loja de conveniência. Para Nagato, que geralmente fica no clube lendo até a escola fechar, estar aqui, significava que ela foi embora depois de nós.

"Ah! Você mora por aqui? Que coincidência!"

Nagato concordou com seu rosto pálido. Por favor, como isso poderia ser uma coincidência?

"Você ouviu algo sobre Asakura?"

Ela balançou a cabeça afirmativamente.

Percebi latas de comida e vegetais dentro da sacola e pensei: então ela pode comer afinal!

"O que aconteceram com seus óculos?"

Nagato não respondeu diretamente, apenas me encarou calada. Fiquei um pouco assustado por ser encarado por ela daquela maneira, Haruhi, que não esperava uma resposta, apenas deu de ombros e caminhou sem virar o seu rosto. Levantei meu braço e me despedi de Nagato.

Enquanto passava ao seu lado, Nagato murmurou. "Tenha cuidado."

Ter cuidado com o que dessa vez? Eu estava preste a perguntar para ela, mas Nagato já tinha entrado no condomínio.


Segui Haruhi, que caminhava sem rumo ao lado da linha do trem, permanecendo dois ou três passos atrás dela. Poderíamos ficar longe de casa se continuássemos assim, então, perguntei a ela onde estávamos indo.

"Nenhum lugar em particular." - respondeu.

Olhei para as parte detrás da cabeça de Haruhi e perguntei: "Então posso ir para casa agora?"

Neste momento ela parou de andar, parecendo que estava prestes a cair para frente. Então Haruhi me olhou com um rosto tão pálido quanto o de Nagato.

"Você já percebeu o quanto a sua existência é insignificante neste planeta?"

Do que você está falando?

Ela continuou: "Eu já. Isso é algo que jamais irei esquecer.”

Ficamos parados na calçada ao lado da linha do trem, enquanto Haruhi começou a falar.

"Quando estava na sexta série, fui com minha família ver um jogo de baseball, eu não estava particularmente interessada no jogo, mas quando cheguei lá, fiquei chocada, pois havia pessoas em todo o meu redor. As pessoas do outro lado do estádio eram como pequenos grãos de arroz, em constante movimento. Pensei que as pessoas de todo o Japão estavam reunidas lá. Então perguntei ao meu pai quantas pessoas haviam ido ao estádio. Ele disse que em um dia lotado, estavam umas cinqüenta mil pessoas."

"Depois do jogo, a estação estava abarrotada de pessoas. Ao ver isso novamente entrei em estado de choque. Haviam tantas pessoas ali, e elas eram apenas uma minúscula fração de todas as pessoas do país. Li na aula de geografia que a população japonesa era de uns cem milhões, então cheguei em casa e fiz as contas usando uma calculadora, para descobrir que cinqüenta mil era apenas uma parte em duas mil da população total [2]. Fiquei pasma outra vez, eu era apenas uma pequena parte das milhares de pessoas lá, e essas milhares de pessoas eram apenas uma ínfima parte do pais inteiro."

2-[Nota do tradutor: 1/200, ou 0,0005%].

"Antes disso, sempre me achava especial. Era feliz com a minha família, e sentia que as pessoas mais interessantes do mundo estavam na minha sala. Deste dia em diante, percebi que as coisas não eram assim. As experiências que tinha na escola, que achava as coisas mais divertidas do mundo, se transformaram em coisas que poderiam existir em qualquer escola. Para o país inteiro, isso não era nada especial. Quando descobri isso o mundo inteiro perdeu a cor. Escovar os dentes e ir dormir... então acordar e tomar café da manhã. Você poderia ver isso em todos os lugares."

"Comecei a me sentir entediada quando percebi que essas coisas eram partes de uma vida comum, acreditei que se haviam tantas pessoas no mundo, deveria existir alguém que vivia de forma extraordinária, em uma vida cheia de excitação. Mas, por que essa pessoa não era eu?"

"Depois de me graduar no primário pensei nisso tudo. Então quando entrei no fundamental, decidi mudar. Queria que o mundo inteiro soubesse, eu não sou uma garota que iria sentar e esperar. Tentei acreditar que havia feito o meu melhor, mas tudo permaneceu como era. Agora estou no colegial, ainda desejando que alguma coisa mude..."

Quando ela terminou, fez uma expressão de arrependimento de ter dito aquilo tudo, e olhou para o céu angustiada.

Haruhi disse tudo sem nenhuma pausa, como uma participante em um concurso de discursos. Quando ela terminou, fez uma expressão de arrependimento de ter dito aquilo tudo, e olhou para o céu angustiada.

Um trem passou rapidamente por nós. Graças ao barulho, tive tempo de pensar se deveria continuar perguntando ou se deveria dizer algo filosófico que agradasse a Haruhi. Vi o trem se afastar de nos, deixando para trás o som do efeito Doppler [3], e disse.

3-[Nota do tradutor: efeito Doppler é um processo físico que diz que a percepção da amplitude de uma onda sonora se altera conforme a velocidade e a distancia de um objeto que emite esse som, por exemplo, as sirenes emitem sons mais agudos ao estarem longe, que vão ficando mais graves conforme se aproximam].

"Entendo."

Minha inabilidade em dizer algo me deixou um tanto melancólico. Haruhi ajeitou o cabelo, soprado pela rajada de vento causada pelo trem.

"Estou indo para casa."

Depois disso ela rumou pelo caminho que viemos. Achei que iria chegar mais rápido em casa se seguisse o caminho que Haruhi tomara, mas suas costas diziam silenciosamente "Não me siga!", então decidi ficar parado ali, olhando Haruhi caminhar até sair de minha vista.

Que diabos eu estou fazendo?


Quando fui para casa, encontrei Koizumi esperando ao lado da porta.

"Olá."

Seu sorriso parecia um pouco falso, era como se nos conhecêssemos por dez anos ou coisa assim. Ele acenou para mim, usando seu uniforme e segurando sua mala, aparentemente ele havia acabado de vir da escola.

"Queria manter a promessa que fiz a você outro dia. É por isso que estou lhe esperando. Nunca pensei que você chegaria tão rápido!"

Koizumi continuava com seu sorriso presidencial no rosto.

"Posso tomar um pouco do seu tempo? Gostaria de te levar em um lugar."

"Tem algo a ver com Suzumiya?"

"Sim, tem algo a ver com Suzumiya-san."

Abri a porta e deixei a mala na entrada. Depois de falar com a minha irmã, que tinha acabado de chegar, que me atrasaria um pouco esta noite. Voltei para perto de Koizumi.

Minutos depois, nossa carona chegou.

Koizumi acenou para que um táxi parasse em frente a minha casa, então fomos à direção leste pela estrada principal. Koizumi disse ao motorista para ir a uma grande cidade fora do município. Seria mais barato ir de trem, mas como era Koizumi que estava pagando, eu não ligava.

"Certo, qual era a promessa que você disse que iria cumprir?"

"Você não disse que queria ver meus poderes? Agora é a chance, por isso quis que você viesse!"

"É preciso ir assim tão longe?"

"Sim. Só posso usar meus poderes, em condições e lugares específicos. E esse local aonde vamos se enquadra nessas condições."

"Você ainda acredita que Haruhi é Deus?"

Koizumi, que sentava ao meu lado, olhou para as calçadas.

"Você já ouviu falar do Princípio Antrópico?"

"Nunca ouvi falar."

Koizumi suspirou e sorriu novamente.

"Basicamente é a teoria que diz que se algo é verdade para nós, humanos, para existir, então é verdadeiro simplesmente por que nós existimos."

Não entendi.

"O universo existe, pois estamos aqui para observá-lo. Em outras palavras uma forma de vida inteligente conhecida como humanos, souberam da existência do universo através da observação da formação do universo pela descoberta das leis da física. Se nós não tivéssemos evoluído para o nível atual, esta observação não seria possível, e não saberíamos da existência do universo."

Isso significa que se o universo existisse ou não, para um humano que não está completamente evoluído, não faria muita diferença. É pela a presença de nós humanos completamente evoluídos que a existência do universo é amplamente aceita, então não importa se o universo realmente existe ou não. Pois a nossa presença viabiliza a sua existência. Esse é o modo de pensar do ponto de vista dos seres humanos."

"Isso é ridículo! Não importa se os humanos estão por aqui, o universo é o universo!"

"Você está certo. Isso é o porquê o Princípio Antrópico não pode ser considerado algo científico, ele é meramente uma teoria especulativa. Porém ela trás alguns fatos interessantes a nossa atenção."

O táxi parou em um sinal vermelho, o motorista olhava apenas para frente, e nunca se incomodou em se virar e olhar para nós.

"Por que o universo está em uma condição tão cômoda para a habitação humana? Uma minúscula alteração na constante gravitacional significaria um universo completamente diferente do que vivemos. Outras coisas como a constante de Planck [4], ou o nível do raio das moléculas atômicas parecem ter sido desenhadas apenas para que os humanos possam viver neste universo. Você não acha isso incrível?"

4-[Nota do tradutor: a constante de Planck, representada por h, é uma constante física usada para descrever o tamanho dos quanta. Tem um papel fundamental na teoria de Mecânica quântica, e tem o seu nome em homenagem a Max Planck, um dos fundadores da Teoria Quântica. Seu valor é de aproximadamente 6,626068 × 10-34 m2 kg / s ].

Senti minhas costas coçando. Esse tipo de coisa que Koizumi falava parece ter sido tirado dos panfletos retóricos daquelas religiões pseudocientíficas.

"Relaxe! Eu não acredito na existência de um Deus todo poderoso,e onisciente que criou a humanidade. Muitos de meus companheiros também pensam assim. Porem há algo que nos incomoda."

Se sentem incomodados com o que?

"As coisas que fazemos. Será que elas são tão estúpidas quanto um palhaço plantando bananeira na borda de um penhasco?"

A expressão no meu rosto naquele momento deveria ser bem estranha, ou Koizumi não teria gargalhado tanto quanto um frango com asma.

"Estava brincando!"

"Não tenho idéia de que diabos você está falando."

Eu realmente queria dizer a ele. Não tenho tempo de ficar ouvindo piadas estúpidas suas. Posso ir embora? Motorista, se importa em dar meia volta? Se possível, prefiro a segunda opção.

"Só estava usando o Princípio Antrópico como comparação. Ainda não entramos no assunto que envolve Suzumiya-san."

Isso era muito estranho! Porque você, Nagato, e Asahina estavam tão interessados em Haruhi?

"Acho ela uma pessoa muito carismática. Mas vamos deixar isso de lado por enquanto. Você se lembra quando eu disse que o mundo provavelmente foi criado por Suzumiya-san?"

Eu não gostava do que estava dizendo, mas lembro de isso ter sido mencionado.

"Ela tem a habilidade de realizar desejos."

Não faça esse tipo de afirmação tão diretamente.

"Eu não posso pensar de outra maneira, visto que, agora o mundo está andando na direção dos desejos de Suzumiya-san."

Como isso era possível?

"Suzumiya-san sempre acreditou na existência de aliens, e por for isso que Yuki Nagato apareceu. Similarmente ela queria conhecer viajantes do tempo, e novamente, foi por isso que Mikuru Asahina apareceu. Eu também surgi pelas mesmas razões."

"E como você sabe disso?"

"Foi há três anos..."

Três anos atrás de novo! Estou cansado de ouvir isso!

"Um dia subitamente percebi que possuía um poder especifico, e por algum motivo, entendi completamente como usar este poder. Ao mesmo tempo, descobri que outros como eu também tinham seus poderes despertos, e que esses poderes foram concedidos por Suzumiya Haruhi. Eu não posso entrar em detalhes, então tudo que posso dizer é que eu sei dessas coisas sem ao menos poder explicá-las."

"Certo, mesmo que eu acredite que você tem poderes, eu ainda não acredito que Haruhi possa fazer o que você disse."

"E nem eu. Uma mera colegial com a habilidade de mudar o mundo – desculpe, acho que é mais algo como criar mundos, não? A coisa assustadora é que essa garota está achando que o mundo em que está é chato."

"E por que isso?"

"Já não disse isso antes? Se ela pode criar mundos a vontade, naturalmente ela pode fazer esse mundo desaparecer sem nenhum rastro, e o reestruturar de acordo com a sua vontade. Então, em um sentido literal, será o fim do mundo. Não podemos determinar se essa teoria é correta; quem sabe se o mundo que consideramos único já foi recriado inúmeras vezes no passado."

Eu estava usando demais a palavra "inacreditável" acho que preciso de um dicionário.

"Se esse é o caso, porque não dizer a Haruhi quem você realmente é? Deixe-a saber que espers existem. Se ela souber, aposto que ficará realmente feliz. Talvez então ela não queira mais destruir o mundo!"

"E isso acarretaria em problemas maiores. Se Suzumiya-san achar que a existência de espers é algo comum, então o mundo será assim. E todas as leis da física serão distorcidas: a constante molecular, a segunda lei da termodinâmica [5], e o resto do universo mergulharão no caos."

5-[Nota do tradutor: enquanto a primeira lei da termodinâmica estabelece a conservação de energia em qualquer transformação, a segunda lei estabelece condições para que as transformações termodinâmicas possam ocorrer. Em relação à transferência de calor, de acordo com a segunda lei].

"Há algo que ainda não entendo." - continuei - "Me lembro de você dizendo que Haruhi queria encontrar aliens, viajantes do tempo e espers, e foi isso que fez com que você, Nagato-san, e Asahina-san aparecessem diante a ela?"

"Sim."

"Se isso é verdade, por que Haruhi não descobriu ainda? Contrastando com isso, apenas eu e você sabemos disso tudo, não é um pouco estranho?"

"Você acha isso inconsistente? Pois não é; a real inconsistência está no coração de Suzumiya-san."

Você poderia dizer algo que eu entendo, por favor!?

"Em outras palavras, ela espera que aliens, espers, e viajantes do tempo existam. Seu senso comum, em contraposição, diz a ela que essas coisas não existem, o que cria uma ressonância cognitiva. Mesmo ela aparentando ser excêntrica, seus pensamentos são como os de uma pessoa comum. Seu entusiasmo tempestuoso lentamente diminuiu nos últimos meses, e estávamos felizes em vê-lo se estabilizar, mas uma mudança súbita ocorreu."

"E por que isso?"

"É por causa de você.”

Koizumi levantou os lábios.

"Se você não tivesse dado idéias estranhas para Suzumiya-san, nós poderíamos a observar por trás dos panos agora."

"O que foi que eu fiz!?"

"Você a encorajou a criar um clube esquisito. Tudo devido a uma conversa que teve com você, ela teve a idéia de formar um clube para reunir todos os personagens misteriosos. Então você tem de carregar toda a responsabilidade disso. É por sua causa que os três grupos interessados em Suzumiya Haruhi estão juntos."

"... essa é uma acusação injusta!" - me defendi de maneira não convincente.

Koizumi sorriu e continuou: "Mas é a única razão."

Ele parou de falar após dizer aquilo. Quando ia falar alguma coisa, o motorista disse: "Estamos aqui."

O carro parou e a porta se abriu. Andei pela rua movimentada junto a Koizumi. O motorista foi embora sem cobrar nada, e eu não estava inteiramente surpreso.

Se as pessoas daqui quisessem fazer compras, esse seria o lugar ideal. Essa típica metrópole local com estações de trem, assim como todo o tipo de loja de departamentos e arquitetura complexa. O pôr do sol banhou a rua repleta de pedestres em uma cor brilhante. Quando as luzes do cruzamento se tornaram verdes, a rua foi inundada por um mar de pessoas. Estávamos separados por essa onda de pessoas até irmos para a calçada.

"O que você quer me mostrar aqui?"

Andando lentamente pela faixa de pedestres, Koizumi olhou para frente e disse. "Ainda há tempo para você mudar de opinião!"

"Já estamos aqui, então corte essa ladainha.”

Andando ao meu lado, Koizumi agarrou minha mão subitamente. Hei, o que você acha que está fazendo!? Isso é nojento!

"Me desculpe, mas poderia fechar os olhos por um instante? Não vai demorar muito."

Esquivei de um pedestre que quase trombara em mim. O sinal verde começou a piscar.

Certo! Eu fechei os olhos a contragosto. Ainda podia ouvir os muitos passos na rua, os motores de carro, e a as conversas sem fim, todo o tipo de sons.

Com Koizumi me guiando, caminhei um, dois, três passos, e então parei.

"Pode abrir os olhos agora."

Lentamente abri os olhos.

E o mundo inteiro transformou-se em tons de cinza.


Estava realmente escuro. Não pude evitar olhar para cima. O brilhante sol alaranjado desaparecera, e o céu estava coberto de sinistras nuvens cinza. Eram realmente nuvens? O horizonte negro crescia sem fim em todas as direções. A única coisa que impedia esse mundo de cair na escuridão era a luz ocasional que brilhava entre as nuvens, substituindo o sol, e produzindo um brilho fraco no céu.

E não havia uma única pessoa.

Tirando Koizumi e eu, parados no meio do cruzamento, toda a multidão que estava lá desaparecera sem deixar pistas. Na vasta escuridão, apenas as luzes do sinal brilhavam, transformando-se em vermelhas, enquanto o outro par de lâmpadas ficavam verdes, mesmo sem nenhum carro na estrada. Estava tão quieto que imaginava se a Terra havia parado de girar também.

"Neste momento estamos no vazio entre uma intersecção dimensional; esse é um espaço restrito, um lugar completamente alheio do mundo em que vivemos."

A voz de Koizumi parecia particularmente clara em meio ao silêncio.

"O centro dessa intersecção cai bem em cima da 'parede' do espaço selado. Olhe, dessa maneira."

Koizumi estendeu o braço pelo ar, que parou como se bloqueado por alguma coisa. Tentei fazer o mesmo, estendendo o braço na mesma direção; senti como se estivesse tocando em vegetais frios e recém lavados. Minhas mãos empurraram a superfície elástica da parede invisível, mas ela não conseguia passar de dez centímetros.

"O espaço selado tem um raio de cinco quilômetros. Normalmente, é impossível entrar por meios físicos. Um dos meus poderes é entrar nesses lugares."

Como varas de bambu paradas, nem uma única luz brilhava das construções ao nosso redor. As lojas do distrito comercial estavam às escuras, com uma única lâmpada de um poste brilhando fracamente.

“Que lugar é esse?"

Não, a questão deveria ser "Que dimensão é essa?"

"Vou explicar enquanto andamos." - disse Koizumi casualmente.

"Não estou certo dos detalhes, mas essa dimensão não se localiza muito longe da nossa... vamos colocar dessa maneira, um espaço vazio entre as dimensões surgiu bem aqui, e entramos por este vazio. Neste momento o mundo de fora continua em sua vida cotidiana. É praticamente impossível para humanos normais entrarem aqui por acidente."

Cruzamos a rua. Koizumi andou em uma direção que ele já havia decidido.

"Imagine uma dimensão semi-esférica invertida, esse lugar é o seu interior."

Entramos em um conjunto de apartamentos, mas nenhuma pessoa podia ser vista, nem mesmo um grão de poeira.

"Os espaços restritos ocorrem randomicamente. Às vezes uma vez por dia, e às vezes uma vez em vários meses. Porem, uma coisa é certa."

Subimos as escadas escuras. Se não estivesse seguindo Koizumi de perto, teria tropeçado.

"Quando Suzumiya-san está mentalmente instável, esse espaço surge."

Chegamos à cobertura do prédio.

"Quando um Espaço Selado aparece, sou capaz de sentir; assim como meus companheiros. Como sabemos disso? Francamente, nem mesmo nós sabemos. Em todo caso, apenas compreendemos onde e quando um Espaço Selado vai ocorrer, e como penetrá-lo. Não posso descrever esse sentimento em palavras."

Parei no beiral da cobertura e olhei para o céu; nenhuma brisa podia ser sentida.

"Você me trouxe para ver isso? Mal tem alguém aqui!"

"Não, a verdadeira atração vem depois disso. Está prestes a começar."

Pare de ficar brincando! Mas Koizumi fingiu não ver minha expressão de desprazer.

"Minhas habilidades são meramente encontrar e penetrar em Espaços Selados. Para ser honesto, posso até mesmo detectar o estado mental de Suzumiya-san. Esse mundo é como uma ferida criada pelo estado emocional instável de Suzumiya-san, e eu sou o remédio designado para curar essas feridas."

"Sua comparação é difícil de entender."

"As pessoas me dizem isso com freqüência. De qualquer maneira, você é incrível! Não parece nem um pouco abalado em ver tudo isso."

Naquele momento, imagens de Asakura desaparecendo sem deixar rastros, e de uma Asahina crescida passaram pela minha mente: Eu já tive experiências demais com coisas do gênero.

Subitamente, Koizumi levantou a cabeça e olhou ao longe.

"Vai começar. Vire-se e olhe atrás de você.”

Então eu vi aquilo.

Parado em frente aos edifícios altos, ao longe estava um gigante azul brilhante.


Era maior do que um prédio de trinta andares. Uma figura magra, de um azul escuro parecia conter algum material fosforescente que o permitia brilhar por dentro. Sendo que ainda estava escuro, não percebi nenhum contorno, tirando os olhos e boca, que eram um pouco mais escuros, não parecia haver nenhuma outra característica notável em seu rosto.

Que diabos era aquilo?

O gigante lentamente levantou os braços e os abanou como um machado.

A construção ao seu lado fora destruída na metade; e como se estivesse em câmera lenta, o concreto, fios, e escombros caíram ao chão em um barulho surdo.

"Acreditamos que essa seja a manifestação da frustração de Suzumiya-san. Toda vez que seus conflitos internos atingem certos níveis, esse gigante surge e destrói tudo ao seu redor para aliviar a pressão, mas não podemos deixar que essa coisa chegue a nossa realidade, ou causará uma grande catástrofe. Para isso que os Espaços Restritos são criados, para conter a destruição do lado de dentro. Isso faz sentido?"

Toda vez que o gigante azul mexia os braços, os prédios eram fatiados ao meio e desabavam. Então o colosso seguia em frente, pisando nos escombros. Surpreendentemente, eu só conseguia ouvir o som das construções caindo, mas não dos passos do gigante.

"De acordo com as leis da física, é impossível para um gigante como ele ficar em pé, devido ao seu peso. Porém ele é capaz de andar livremente em um estado sem peso. Penso que destruir um prédio envolve mudanças em sua estrutura molecular, então essas leis não parecem se aplicar a ele. Nem mesmo um exército poderia detê-lo."

"Então vamos deixar ele seguir o seu caminho?"

"Não, e é para isso que eu existo. Por favor, olhe para lá."

Koizumi apontou para o gigante. Olhei para a direção que ele indicava e percebi alguns poucos pontos vermelhos brilhantes que não estavam por lá há pouco, eles voavam ao redor da criatura. Comparado ao imenso gigante azul, os pontos vermelhos pareciam meras sementes de gergelim. Havia no total uns cinco deles, mas como estavam voando em altíssima velocidade, meus olhos não podiam os acompanhar. Como satélites, as esferas orbitavam ao redor do gigante, como se quisessem o impedir de prosseguir adiante.

"Esses são meus companheiros, que como eu, obtiveram poderes de Suzumiya-san, guerreiros encarregados de caçar esses gigantes."

Os pontos vermelhos esquivavam-se dos braços do gigante com destreza, enquanto mudavam sua rota de vôo e atacavam o corpo do monstro. Seu corpo parecia ser feito de gás, portanto os pontos simplesmente voavam por entre ele.

De qualquer forma, o gigante parecia não se incomodar com os ataques, e levantou os braços novamente, para esmagar outra loja de departamentos.

Não importa como as manchas rubras atacassem, o colosso não parecia parar. Raios laser avermelhados penetravam o seu corpo sem parar, mas eu estava longe demais para perceber se eles haviam feito algum estrago. Uma coisa era certa: os raios não estavam criando nenhum buraco no corpo do gigante.

"Certo, acho que devo me unir a eles agora."

O corpo de Koizumi começou a brilhar em vermelho, e rapidamente ele foi coberto por uma esfera vermelha brilhante. Parado em minha frente não estava mais um humano, e sim uma grande bola vermelha luminosa.

Isso estava ficando ridículo.

Como se estivesse fazendo um sinal, e esfera subiu alguns metros e voou reto em direção ao gigante, com uma velocidade incrível.

Como os pontos vermelhos nunca pararam de voar, não podia saber quantos deles havia no total, mas o número não devia passar de dez, incluindo Koizumi. Eles bravamente avançaram sobre o corpo da imensa criatura, mas tudo que via era eles voando por dentro dela. O girante estava muito pouco, isso se estava, ferido. Enquanto pensava daquela maneira, uma das esferas se aproximou do pulso do gigante e a circulou.

No momento seguinte, a mão dele fora decepada. O braço sem vida caiu no chão com um brilho em mosaico, ficando transparente, até que se desintegrou como neve derretendo sob o sol quente. Acho que a fumaça azulada vindo da mão cortada do gigante deveria ser sangue. Essa cena realmente era uma coisa digna de ficção.

Os pontos vermelhos mudaram o seu estilo de ataque. Se aproximaram do gigante como pulgas cercando um cão. Os raios vermelhos cortaram o rosto da criatura, fazendo que sua cabeça caísse; depois disso o ombro foi cortado, seguido pelo resto de seu tronco, deixando para trás uma forma estranha. Os pedaços que caiam viravam mosaicos, antes de se desintegrar e desaparecer.

Como o gigante estava em uma área aberta, sem nenhum obstáculo em volta, fui capaz de ver o processo do inicio ao fim. Quando o tórax foi arrancado, o resto do corpo também se desintegrou, finalmente se dissolvendo em grãos menores que areia, que se espalharam pelos escombros.

Uma vez que os pontos vermelhos tinham certeza que concluíram o seu trabalho, voaram para longe em todas as direções. Muitos desapareceram de uma só vez; mas um voou em minha direção, pousando sobre o telhado do condomínio de apartamentos. A esfera lentamente perdeu seu brilho, e finalmente Koizumi parou em minha frente, abanando os seus cabelos pretensiosamente com seu sorriso de sempre.

"Desculpe-me por deixá-lo esperando."

Ele soava muito calmo, não parecia que tinha sido muito exaustivo.

"Finalmente, eu quero mostrar uma última coisa muito interessante."

Ele apontou para o céu. Eu levantei a cabeça desconfiado, e no macabro céu acinzentado, eu vi aquilo!

Bem acima de onde o gigante apareceu estava uma rachadura, como a de um pássaro que tentava sair de um ovo. A rachadura começou a se espalhar rapidamente como uma teia de aranha.

"Depois da destruição da criatura azul, o Espaço Restrito também é destruído, e isso é um espetáculo a parte."

Antes mesmo de Koizumi terminar a sua explicação, as grandes fendas já haviam coberto o mundo inteiro, era como estar sob uma grande teia metálica. As margens ficaram mais estreitas, até se tornaram meras linhas escuras. E nesse momento...

Crack!

Para falar a verdade, não havia nenhum som audível. Era apenas o meu cérebro tentando simular o som de vidro quebrando. A luz penetrou de um ponto no céu, se espalhando em todas as direções na esfera. Eu senti a chuva de luz nos atingindo. Não, essas não eram as palavras certas; era mais como o teto do Tokyo Dome [6] se abrindo, tudo em pouquíssimos segundos. A única diferença é que há pouco esse teto cobria todos os prédios abaixo dele.

6-[Nota do tradutor: Tokyo Dome (東京ドーム Tōkyō Dōmu) é um estádio de 55 mil assentos localizado em Bunkyo, Tóquio, Japão].

Um som alto de agitação atacou os meus ouvidos, e eu os cobri instintivamente. Mas era apenas uma conseqüência de ter passado algum tempo em um mundo silencioso. Quando ouvi direito, percebi que era só o som comum da agitação da vida cotidiana.

E o mundo voltara a seu estado original.

Não havia mais prédios destruídos, nem o incomodo céu cinza, e ainda menos as esferas brilhantes cruzando os céus. A rua estava cheia de carros e pessoas. Um brilho laranja familiar podia ser visto entre as construções. O mundo inteiro parecia estar grato a receber esse calor, e deixava longas sombras para trás.

A brisa soprou suavemente.


"Agora você entende?"

Koizumi me perguntou assim que entramos no táxi, que pareceu parar magicamente em nossa frente assim que saímos do condomínio. Quando olhei, percebi que era o mesmo motorista da última vez.

"Não." - respondi com sinceridade.

"Sabia que você ia falar isso." - Koizumi riu, - "Essas criaturas azuis, que chamamos de Celestiais, como havia dito antes, estão vinculados ao estado mental de Suzumiya-san. Assim como nós, é claro. Uma vez que um Espaço Restrito surge, uma vez que os Celestiais comecem a se mover, nós somos capazes de usar nossos poderes. Nós apenas os podemos usar lá; nesse instante, estou completamente sem poderes."

Silenciosamente olhei para as costas do motorista.

"Não sei por que apenas nós temos esses poderes, mas não tem nada a ver com nossas identidades. É como ganhar na loteria; mesmo com as chances sendo baixas, sempre haverá alguém capaz de vencer. Apenas aconteceu de meu nome estar escrito nesta flecha."

"Que azar o meu!" – disse Koizumi com um sorriso irônico. Permaneci em silêncio, pois não sabia o que deveria dizer.

"Não podemos deixar os Celestiais se moverem com liberdade. Por que isso? Pois quanto maior o estrago causado pelos Celestiais, maior a esfera do Espaço Restrito irá se tornar. O que você viu era um dos menores, mas se o deixássemos livre para agir, ele iria começar a crescer até engolir o mundo inteiro, e finalmente, esse mundo cinza iria substituir o nosso mundo por completo."

Finalmente abri a minha boca.

"Como você sabe tanto?"

"Já lhe disse, eu apenas sei, não pode ser explicado. Com todos associados com a 'Organização' acontece o mesmo. Um dia nós simplesmente soubemos tudo sobre Suzumiya-san e como ela pode afetar esse mundo, assim como percebemos que temos poderes sobrenaturais, então não podíamos deixar que os Espaços Restritos continuassem intocados. Quando pessoas comuns descobrem esse tipo de coisa elas geralmente querem ajudar. Se não fizermos sabemos que o mundo pode ser destruído."

"E isso seria um grande problema." - Koizumi calou-se após resmungar estas palavras.

Antes de chegar a minha casa, ficamos apenas em silêncio observando para fora da janela.

O carro parou, e enquanto descia dele, Koizumi falou.

"Por favor, preste atenção nas ações de Suzumiya-san. Seu suposto estado de equilíbrio mental começou a dar sinais de mudanças rápidas. Já faz algum tempo que algo como hoje ocorreu pela última vez."

Mesmo que eu preste atenção, ela vai continuar sendo assim, não está certo?

"Francamente, eu não tenho certeza. Mas acho uma boa idéia deixar tudo em suas mãos, meus companheiros tendem a pensar nas coisas de uma forma complexa demais."

Antes que pudesse responder, Koizumi voltou para dentro do táxi e fechou a porta. Enquanto observava o lendário táxi fantasma se afastar, subitamente comecei a me sentir incrivelmente estúpido, sem outras opções voltei para dentro de casa.



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