Kizumonogatari ~Brazilian Portuguese~/Koyomi Vamp/002
002[edit]
Se você fizer amigos, sua força como ser humano diminuirá.
Acho que eu disse algo assim.
Lembro-me que aconteceu no sábado, dia 25 de Março, um pouco antes das férias de primavera, na tarde da cerimônia de encerramento – naquela hora, eu estava vagando próximo à escola que frequento, o Colégio Particular Naoetsu.
Eu não participo de nenhum clube de atividades.
Só estava andando a esmo, sem pensar muito, relaxando.
Com certeza eu não estava animado com o prospecto do início das férias de primavera no dia seguinte.
Não só as férias de primavera. Seja as férias de verão, as de inverno ou a Golden Week, longos períodos de folga são ocasiões em que os estudantes devem ficar felizes, e até mesmo eu estava, essencialmente, feliz pelo fim do terceiro período escolar e pela chegada das férias de primavera, mas, ao mesmo tempo, também é um fato que férias me dão mais tempo livre do que eu preciso.
Mas esse é o caso, principalmente, para as férias de primavera, porque não havia lição de casa.
Por alguma razão, não sinto vontade de ficar em casa.
Sendo esse o caso – a cerimônia de encerramento acabou, nós pegamos nossos boletins na sala de aula, a turma debandou depois de um “nos vemos no próximo ano”; e, mesmo assim, nesse momento, eu ainda não sinto vontade de voltar para casa.Sem ter nenhum outro lugar para ir, eu fico zanzando em volta da escola como um estranho suspeito.
Eu não tenho nada para fazer.
É mais uma tentativa de matar o tempo do que de matar o tédio.
É o seguinte: mesmo que eu vá para a escola de bicicleta, a bicicleta em si ainda estava dentro do estacionamento de bicicletas, que fica dentro do colégio. E este é outro sinal de que eu ainda não estou planejando voltar para casa.
Minha caminhada é só uma caminhada.
É óbvio que eu não sou daqueles obcecados em manter a forma física.
Eu poderia estar passando o tempo dentro da escola também, mas havia uma razão por que ficar no colégio era tão difícil quanto ficar em casa – mesmo que fosse a tarde do dia da cerimônia de encerramento, ainda havia muita gente no colégio participando das atividades de clubes.
Não gosto de gente se esforça tanto.
Não que nossa escola seja assim tão enfática quanto às atividades de clube. A exceção é o clube feminino de basquete, ao qual se juntou um monstro de um jogador-mirim que se matriculou aqui no ano passado devido a algum engano, mas fora isso a atitude geral é “O importante é participar” até mesmo nos outros clubes esportivos.
Por esse motivo – embora não fosse, exatamente, um motivo de verdade – eu estava só caminhando em volta das premissas do colégio, mas como estava começando a pensar que talvez fosse a hora de pegar minha bicicleta no estacionamento e ir pra casa – afinal, eu estava com fome – e então avistei uma pessoa inesperada.
Como já era férias de primavera, era complicado definir se estávamos no segundo ou no terceiro ano, mas, de qualquer maneira, uma estudante popular do mesmo ano que eu – Hanekawa Tsubasa – estava andando à minha frente.
Eu me perguntava o que ela estava fazendo com as duas mãos na nuca – parecia estar arrumando a trança. Ela usa uma trança para conter seu cabelo longo às costas. Uma trança por si só já é coisa rara atualmente, mas ela também cortou a franja numa linha reta e alinhada.
Ela estava usando o uniforme da escola.
O modelo não mudou nada. Uma saia que vai até dez centímetros abaixo do joelho.
Um cachecol preto.
E ela estava usando até agasalho do uniforme por cima de sua camisa.
E, além disso, ela usava as meias brancas e os sapatos da escola. Tudo, perfeitamente, de acordo com os padrões.
Sem dúvidas, o visual de uma estudante exemplar.
Não só o visual, como o resto também.
Uma estudante exemplar entre os estudantes exemplar. Uma representante de turma entre os representantes de turma.
Eu estive em turmas diferentes durante o primeiro e o segundo ano, o que justifica que ela não me conheça, mas eu ouvi falar sobre ela e sua atuação como representante de turma.
Não me interesso muito em fofoca, então posso ter escutado só metade da história, mas mesmo assim parece que ela é uma representante de turma e tanto.
Tenho absoluta certeza de que ela será representante de turma até no terceiro ano.
E ela terá notas excelentes.
Vai parecer estranho explicar assim, mas parece que ela é absurdamente brilhante. Do tipo que costuma gabaritar todas as provas, em todas as matérias, sem dificuldade, como se fosse a coisa mais fácil do mundo. Se todos os estudantes fazem uma prova, é tão natural que haja um primeiro colocado quanto que haja um último colocado, e é natural que as posições oscilem, sem que ninguém permaneça invicto para o bem ou para o mal. Mas ela quebra qualquer possibilidade de oscilação – ela esteve em primeiro lugar em tudo, durante esses dois anos.
Embora eu fosse um bom aluno no momento em que me matriculei no Colégio Naoetsu, num piscar de olhos, notei que estava me tornando um ignorante e, quando meus olhos se abriram de novo, percebi que já havia me convertido a um parvo. Entre eu e ela existe uma diferença tão grande quanto a distância entre o céu e a terra. Ou talvez eu deva dizer que somos antíteses.
Hmm.
Ela, imediatamente, atraiu minha atenção.
Como estávamos em turmas diferentes, embora eu a conhecesse, no fim de contas, eu não havia me encontrado muito com ela e estava um pouco surpreso por vê-la, por acaso, depois da cerimônia de encerramento.
Bem.
Por acaso, acidentalmente.
Parece que ela estava saindo pelo portão da escola. E, pensando bem, como eu estava ali andando sem destino certo, não é tão estranho que tenha me deparado com ela.
Como era de se esperar, Hanekawa não me percebe.
Ela parecia estar concentrada em arrumar as tranças, como se eu não estivesse dentro do seu campo de visão – bem, mesmo se eu estivesse, ela e eu não somos íntimos nem sequer ao ponto de nos cumprimentarmos quando nos encontramos.
Hahaha.
Em vez disso, uma estudante exemplar como Hanekawa iria certamente desprezar alguém que vive com tão poucas preocupações como eu.
Ela é dedicada e eu sou desleixado.
O melhor é que ela não me conheça.
Passemos um pelo outro e deixe estar.
Mesmo dizendo isso, não é como se eu precisasse fugir.
Continuei caminhando no mesmo ritmo , fingindo que não a havia notado – e, se tivéssemos dado mais cinco passos, teríamos passado em segurança um pelo lado do outro..., mas então aconteceu.
Eu.
Provavelmente, nunca me esquecerei deste momento até o fim da minha vida.
Sem nenhum prenúncio – um vento soprou à minha frente.
– Ah
De súbito, fiquei sem ar.
A parte da frente da saia comprida cortada a dez centímetros abaixo do joelho de Hanekawa levantou-se, foi jogada para cima pelo vento.
Normalmente, ela iria abaixá-la instintivamente – mas ocorreu que, justamente nesse momento, suas duas mãos estavam ocupadas, trabalhando na complexa tarefa de ajustar a sua trança. Vendo de onde eu estava, parecia que ela estava tentando fazer algum tipo de pose com as mãos atrás da cabeça. É com isso que se parecia.
Foi sob essas circunstâncias que a saia dela levantou.
E tudo que estava por baixo ficou completamente exposto.
Não era, de forma alguma, algo chamativo – porém, era uma calcinha tão elegante que o olho, cativado pela cena, era incapaz de desviar a atenção.
Era de um branco puro e limpo.
Não era nada sugestivo. A área coberta era, na realidade, bastante grande. Era do tipo que cobre tudo com tecido espesso – sem nada de luxúria. Aliás, até poderia-se dizer que não era lá muito sexy.
Contudo, eu sentia como se estivesse me afogando na estonteante luz daquela brancura extrema.
Não era simples de maneira alguma.
Havia um desenho complexo, feito de linha branca em relevo sobre um fundo branco de tecido bordado, na parte central – provavelmente com flores desenhadas no bordado. Essa estampa, simétrica nos lados direito e esquerdo, conferia de maneira primorosa o equilíbrio de toda a calcinha, e a parte a cima do bordado central era adornada com uma pequena fita.
Uma fita que intensificava a impressão de todo o resto.
Além disso, logo acima da fitinha estava visível o seu abdômen e um adorável umbigo.
A saia estava tão fortemente virada para cima que até mesmo essas partes ficaram irrestritamente expostas. Podia-se até ver a barra da camisa aparecendo claramente amarrotada pra dentro da saia. Eu nunca havia imaginado que a barra de uma camisa poderia ser tão excitante até esse momento.
Agora, meu conceito de saia foi completamente reformado. Embora eu veja saias com frequência, elas costumavam ser uma entidade desconhecida e inviolável. Pela primeira vez, eu acho que entendi a estrutura da roupa que chamamos de saia.
E, o melhor de tudo, foi o simples fato de que somente a parte da frente da saia tenha sido levantada.
O branco puro da calcinha e as suas graciosas coxas, como se estivessem numa competição acirrada com essa brancura, eram enfatizadas pelo contraste com o azul escuro da parte de trás da saia.
A saia, um pouco longa se comparada à de uma garota comum, nesta situação era como uma cortina que exaltava uma grndiosa obra de arte. Até as dobras de sua saia pareciam ser feitas de veludo.
Considerando a pose dela, com as mãos atrás da cabeça, parecia que ela estava procurando mostrar a calcinha pra mim. Esse foi o resultado.
Ela.
Hanekawa Tsubasa, no final, não se mexeu nem um pouco.
Ela ficou pasma.
Sua expressão facial congelou, enquanto ela continuava naquela pose, com a saia levantada.
Tudo deve ter ocorrido no espaço de um segundo.
Mas pra mim foi como se tivesse sido uma hora – eu senti como se estivesse alucinando, como se a minha vida estivesse prestes a ter um fim. Isso não é, de forma alguma, um exagero. Eu passei uma vida inteira naquele instante. Ao ponto em que a superfície dos meus olhos chegou a secar.
A parte de baixo do corpo dela havia roubado meus olhos.
Bem, é claro que eu sei – claro que eu sei que, nessa situação, o melhor a se fazer seria ficar quieto e olhar pro outro lado.
E, em situações normais, é o que eu faria.
Se eu estivesse subindo os degraus de uma escada e houvesse uma garota à minha frente, eu teria disciplina mental o suficiente para, pelo menos, olhar para os meus próprios pés.
Porém, eu não sou um homem tão perfeito ao ponto de proceder dessa maneira no instante em que uma benção como essa aparece na minha frente sem aviso prévio nem tempo para eu me preparar.
A silhueta da Hanekawa parecia estar marcada a ferro incandescente nas minhas retinas.
Se eu morresse agora e meus olhos fossem transplantados para outra pessoa, ela iria ter alucinações recorrentes com as calcinhas da Hanekawa pelo resto de seus dias.
Foi um impacto dessa magnitude.
As calcinhas de uma aluna exemplar.
“…………....”
E, aliás.
Por quanto tempo eu vou ficar descrevendo as calcinhas de uma aluna exemplar?
Quando dei por mim, a saia da Hanekawa já havia voltado `à posição inicial.
Realmente, durou apenas por um momento.
E então, Hanekawa.
Ainda pasma – estava olhando pra mim.
Ela me encarava.
– Hã...
Uau.
Esse é um momento ruim para falar com ela.
O que eu deveria fazer em uma hora como essa?
“Eu..... Eu não vi nada, está bem?”
Tentei uma mentira óbvia.
Hanekawa, porém, ignorou minha mentira óbvia, e só continuou me encarando. Terminando de ajustar a trança, ela abaixou as mãos e, apesar se ser tarde demais, alisou a saia contra as pernas.
Apesar de ser, realmente, tarde demais para isso.
E então, por um momento, ela olhou para cima, como se observasse o céu, e depois olhou para mim novamente dizendo:
– Ehehe.
Ela estava acanhada.
……Oh.
Ela riu disso?
Ela é realmente uma mulher muito disciplinada – como era de se esperar de uma representante de turma dentre representantes de turma.
“Bem, o que eu deveria dizer?”
Tap, tap, tap.
Hanekawa deu pulinhos em minha direção com os pés juntos, como se estivesse pulando com protetores de joelhos.
De uma distância de dez passos a uma distância de três passos.
Uma proximidade considerável.
– Quando se pensa sobre isso, saias têm um nível bem baixo de segurança quanto à capacidade de esconder o que você não quer que os outros vejam. Acho eu preciso de outro firewall, como polainas?
– Eu... eu não sei...
Sinto-me incomodado quando usam metáforas.
Eu sou vírus, então?
Para a sorte dela – embora eu não saiba se realmente foi sorte –, de qualquer forma, não havia mais ninguém por perto, nem mesmo alunos do mesmo colégio.
Apenas eu e Hanekawa.
O que significa que fui o único a ver as calcinhas dela.
Meu ego inflou um pouco quando constatei isso, mas vamos deixar isso de lado.
– Acho que foi a Lei de Murphy em ação agora há pouco. Talvez devêssemos registrar, por exemplo, que se você estiver com as mãos ocupadas nas suas costas, sua saia levanta na parte da frente. Normalmente é necessário ter cuidado com a parte de trás, mas, surpreendentemente, a parte da frente também pode ser um ponto cego
– Pois é... Acho que sim.
Sei lá.
Ou melhor, isso é esquisito.
Não sei se foi proposital ou não, mas eu senti como se estivesse sendo repreendido de maneira tangencial com o discurso de Hanekawa – dito isso, o simples fato de ver não tem muito poder persuasivo, mas, certamente, eu me sentia culpado por testemunhar, mesmo sem querer, “o que ela não quer que os outros vejam”.
E, mesmo assim, ela sorria.....
Não tente continuar esta discussão.
– B-Bem, não se preocupe com isso. Eu menti sobre não ter visto nada, mas foi só a silhueta, eu não pude enxergar nada com clareza.
Isso também foi uma mentira.
Eu pude enxergar com tanta clareza que chegar a ser assustador.
– Hã, hm, mm?
Hanekawa inclinou a cabeça.
– Se você conseguiu ver tudo, diga, isso faria uma garota se sentir mais à vontade.
– B-Bem, não é que eu não gostaria de dizê-lo, o fato é que não posso mentir para você.
– Entendo, então não pode mentir para mim.
– Pois é, desculpa por não fazê-la se sentir à vontade. Acho que devia ter mentido”
As palavras de um homem que não falou nada além de mentiras até agora.
– Então deve ter sido minha imaginação, porque me pareceu que a descrição da minha saia durou cerca de quatro páginas.
– É, é, é só a sua imaginação. Até agora eu estive descrevendo uma cena muito bela e comovente.
Isso não foi uma mentira. Poi um eufemismo.
– Bem, acho que vou indo.
E então, levantando minha mão em um gesto de 'eu que não quero continuar essa conversa', continuei caminhando.
Num ritmo rápido.
Mas o que acontecerá?
Hanekawa provavelmente voltaria para casa; e, no caminho, talvez ela conte às suas amigas, com mensagens de celular ou algo do gênero, como eu acabei vendo sua calcinha. Não acho que uma aluna exemplar faria esse tipo de coisa, mas também acho que ela o faria, exatamente, por o ser. Bem, Hanekawa não sabe meu nome mas... Presumo que ela saiba, ao menos, que sou um estudante do mesmo ano que ela.
Percebendo que talvez eu estivesse me precipitando, diminuí o ritmo dos meus passos, e então–
– Espera um pouco!
Uma voz me veio pelas costas.
Era Hanekawa.
Ela me seguiu!?
– Finalmente o alcancei. Você anda muito rápido.
– ...Você não estava voltando para casa?
– Hmm? Bem, mais tarde eu voltarei, é claro, mas por que você está voltando para o colégio, Araragi-kun?
– ...............
Ela sabe o meu nome.
Hein?!
Eu não estou usando um crachá ou algo do tipo, estou?
– Bem, eu ia pegar a minha bicicleta.
– Ah, você volta de bicicleta então?
– Sim... a minha casa é meio longe daqui–
Espera, isso não é o importante.
No entanto, parece que ela não sabe que eu me locomovo por bicicleta.
– Como você sabe o meu nome?
– Hã? Ora, claro que eu saberia. Estamos no mesmo colégio, não estamos?
Afirmou Hanekawa como se fosse evidente.
Do mesmo colégio...
Do jeito que você diz, parece até que estamos na mesma sala.
– Bem, você pode não me conhecer, Araragi-kun, mas você é bem famoso
– Quê?
Eu repliquei de imediato sem pensar.
Aliás, você que é a famosa entre nós.
E, além disso, eu não sou nada mais do que um zero à esquerda no Colégio Privado Naoetsu – eu nem sequer sei se meus colegas saberiam meu nome completo.
– Hmm? Algo errado, Araragi-kun?
– ... ... ...
– Araragi(阿良々木) se escreve com um ‘a’ ('阿') retirado do ‘ka’ ('可') de ‘kanou’ (可能 / possibilidade), dois ‘ras’ ('良') de ‘ii ko’ (良い子 / boa criança), e o ‘gi’ ('木') de ‘jumoku’((樹木 / árvores e arbustos), assim. E o primeiro nome seria ‘koyomi’ ('暦') de 'toshitsuki no koyomi' (年月の暦 / calendário anual), correto? Então é Araragi Koyomi (阿良々木暦).
– ... ... ...
Ela sabe meu nome completo, inclusive os kanjis com que se escreve.
Você está de brincadeira, não é?
Considerando que ela sabe meu nome e minhas feições faciais, se, por algum acaso, ela tivesse um Death Note em suas mãos, eu seria um homem morto...
Se bem que o mesmo vale pra mim.
– E você é... Hanekawa.
Eu não estava tentando equilibrar a situação, nem me recusando a ceder nessa conversa, só falei isso para não confirmar o que ela disse.
– Hanekawa Tsubasa.
– Uau!
A surpresa de Hanekawa era aparente.
– Incrível" Você sabe o nome de alguém como eu!
– Na prova final do primeiro semestre do segundo ano, em todas as matérias, incluindo educação física e artes visuais, faltou-lhe somente uma questão para gabaritar tudo, Hanekawa Tsubasa.
– Hã? Ei, como você sabe de tudo isso?
Hanekawa transbordava de surpresa.
E não parecia estar fingindo.
– Que? Por acaso você é meu stalker, Araragi-kun? Ai, será que sou paranóica demais?
– ... Não é nada disso.
Ela não parece estar a par do fato de que ela é famosa.
Ela provavelmente pensa que é ‘normal’.
Uma garota normal, só um pouco mais esforçada do que a maioria.
E, para completar, ela se sente estranha lidando com uma 'celebridade' como eu – bem, talvez eu tenha, realmente, adquirido fama por ser um ignorante.
Mas chega de explicações.
Eu respondi com uma piada.
– Eu soube disso através de um amigo alienígena meu.
– Hã? Você tem amigos, Araragi-kun?
– Ei! Pergunte se alienígenas existem primeiro!
Eu respondi assim para uma pessoa que acabo de conhecer.
Contudo, ela também foi rude comigo, ainda que não tenha sido intencionalmente.
– Bem, ammm...
E, percebendo sua atitude, conforme o esperado, ela ficou envergonhada.
– Bem, eu sempre tive a impressão de que você é daqueles que está sempre sozinho, que gosta da solidão.
– E os caras legais são assim?
Ela parece me conhecer.
Mas não muito bem.
– Sim, realmente, como você disse, eu não tenho amigos. E você é tão famosa que até mesmo gente sem amigos a conhece.
– Ei, pare com isso!
Ela ficou incomodada com isso.
E estamos falando da garota que, depois de ter a parte de dentro da saia, escancaradamente, exposta, simplesmente sorriu, meio constrangida.
–Eu não gosto deste tipo de piada. Não tire sarro de mim assim, por favor.
– ...Entendo.
Acenei com a cabeça, concordando, já que discordar iria resultar em uma discussão.
Ah, cara.
A faixa de pedestres na frente da escola estava com a luz vermelha acesa, então eu parei de caminhar.
Hanekawa parou do meu lado.
... ... ... ...
Por que ela está me seguindo??
Ela esqueceu algo no colégio?
– Ei, Araragi-kun.
Enquanto eu ponderava.
Hanekawa começou a falar.
– Você acredita em vampiros, Araragi-kun?
– ... ... ... ...
'Do o que diabos ela está falando', eu pensei.
E então me dei conta no instante seguinte.
Sim, ela estava fingindo estar calma, mas na verdade ela estava morrendo de vergonha do fato de eu ter visto as calcinhas dela.
É bem óbvio na verdade.
Eu não era ninguém famoso, mas certamente a Hanekawa devia saber sobre mim – e de alguma maneira ela até sabia sobre os meus contatos (a minha falta de amigos).
Provavelmente, ela não tem escutado rumores muito bons sobre mim.
Nesse caso, não seria estranho ela considerar a minha análise minuciosa.... o meu vislumbre acidental de sua calcinha como uma espécie de mancha em sua reputação.
Então ela me seguiu para resolver esse problema.
Ela não fugiu, imediatamente, depois de eu ter-lhe visto a calcinha pois, ao me seguir e conversar comigo, ela está, sem dúvidas, procurando sobrescrever as minhas memórias.
Hmph...
Muito ingênua, aluna exemplar.
Mesmo que você tente encher-me a cabeça de tópicos estranhos como vampiros, minhas memórias não vão desaparecer.
– O que é que têm os vampiros?
Bem, se isso for o suficiente para satisfazê-la, então discutirei qualquer assunto que ela selecione. Se pensarmos nisso como uma compensação por ter visto a calcinha dela, agradá-la com essa conversa morna não é problema algum.
– É que eu tenho escutado rumores recentemente. Como, por exemplo, que há um vampiro na cidade, então você não deve sair sozinho durante a noite.
– Isso é meio vago.... parece um rumor sem fundamento.
Confessei minha mais honesta impressão sobre o assunto.
– Por que um vampiro viria para esta cidade do interior?
– Não sei.
– Vampiros são demônios estrangeiros, não são?
– Acho que não são demônios, exatamente.
– Se você for enfrentar um vampiro, acho que há uma grande diferença entre ir sozinho e ser acompanhado por dez pessoas.
– Ora, mas é claro!
Ahahahha, Hanakewa riu.
Uma maneira animada de rir.
... ... Eu tinha uma imagem diferente dela.
Isso esteve me incomodando desde algum tempo atrás.
Já que ela é uma aluna exemplar e uma representante de turma dentre representantes de turma, eu esperava que ela fosse agir de uma maneira mais refinada.
Em vez disso, ela é tão amigável que chega a ser estranho.
– Mas existem muitas testemunhas.
– Testemunhas oculares? Interessante. Então por que não me traz essa sua amiga que viu tudo para confirmar as histórias?
– Eu não mencionei amiga alguma.
É um rumor difundido só entre as garotas, Hanekawa me contou.
– Não são só as garotas do nosso colégio, as garotas que frequentam escolas próximas também comentam bastante sobre isso. Embora, pelo que eu saiba, é um rumor que só as garotas espalham.
– Um rumor dividido apenas entre as garotas... parece algo que eu escutei antes em algum lugar.
Mas, um vampiro?
Esse rumor deveria ter se espalhado mais amplamente, não?
– Dizem que é uma bela mulher de cabelos loiros, uma vampira com olhos frios que congelam quem a vê.
– Esses detalhes são mais sólidos, mas não se pode chegar à conclusão que ela é uma vampira só por isso, não é? E se for só uma pessoa comum que chama a atenção por ter cabelo loiro?
De qualquer maneira, esta é uma cidade suburbana e rural.
Uma cidade nos arredores da região.
Não se encontra nem gente com cabelo castanho aqui.
– Porém,
Hanekawa continuou.
– Eu ouvi falar que o cabelo loiro dela, iluminado pela luz dos postes de rua é quase ofuscante... e mesmo assim ela não possui sombra.
– Entendo... ...
Uma vampira.
Eu ouço essa palavra tão corriqueiramente que ela até parece ser um vocábulo antigo do japonês, mas na verdade não sei muito sobre ela.
Entretanto, agora que ela mencionou, eu de fato me lembro de ter escutado que vampiros não projetam sombra nenhuma.
Porque eles são fracos contra a luz do sol.
Contudo, à noite,
Se houver um poste de luz acima de um vampiro, somos capazes de perceber que ele não possui sombra. Mas, não parece ser um boato furado quando a maior evidência é causada devido ao poste de luz?
E mesmo se não for só um boato, ainda assim parece mal formulado.
– Pois é.
Mesmo comigo dizendo algo tão indiferente assim, Hanekawa não ficou chateada, em vez disso ela simplesmente concordou.
Ela fala bem e escuta bem.
– Sim, até eu acho que é um rumor bobo. Mas graças a esse isso as garotas não saem sozinhas durante a noite, então acho que é bom para a ordem pública.
– Bem, acho que você está certa.
– Mas sabe...
Hanekawa diminuiu, de leve, o tom de voz.
– Se vampiros existem, eu gostaria de me deparar com um deles.
– ... Por quê?
Por alguma razão.
Talvez minha suposição fosse incorreta.
Achei que ela estivesse usando esse papo descompromissado para apagar minha lembrança de sua calcinha – mas ela fala de uma maneira entusiasmada demais.
E, parando para pensar, contar a um cara como eu, enquanto vestida com o uniforme do colégio, sobre “um rumor só de garotas” parece muito estranho.
– Você morre se eles sugam o seu sangue, sabia?
–Oh, mas eu não quero morrer. Vejamos, talvez ‘me deparar com um deles’ não seja a melhor maneira de me expressar. Só penso que seria interessante se uma criatura tão... sobre-humana existisse.
– Sobre-humana? Como um deus?
– Só que não precisava ser um deus
Hanekawa permaneceu quieta por um tempo, como se estivesse escolhendo as palavras, mas, finalmente,
– Caso contrário, nada seria realmente interessante, não é?
Ela disse.
E então, de súbito,
A luz dos pedestres ficou verde.
Mas nem Hanekawa nem eu nos mexemos.
Para ser franco:
Não entendo nada disso, não somente o que a Hanekawa diz, como também o que ela queria dizer... é como se as nossas conversas não tivessem se conectado.
– Oh, me desculpe!
Talvez minha expressão facial estivesse denunciando os meus pensamentos, pois Hanekawa disse isso em tom de pânico.
“Araragi-kun, você é, inesperadamente, alguém fácil de se conversar. Eu me deixei levar, espero que não tenha contado algo para você que não faça o menor sentido”
– Ah... não, não foi nada. Está tudo bem.
– É estranho que você seja tão aberto a diálogos e ainda assim não tenha amigos. Por que você não faz alguns?
Ela me perguntou diretamente.
Provavelmente, não querendo causar mal algum.
Eu entendo isso, pelo menos.
Não é que não eu faça amigos, é que eu não consigo fazer nenhum, mas hesitei em responder de cara.
É por isso que... naquele momento, eu respondi assim.
– Se você fizer amigos, sua força como ser humano diminuirá.
– ...Hã?
Hanekawa me encarou, confusa.
– Desculpe-me, mas não entendi muito bem o que você quer dizer com isso.
– Bem,... sabe,... é tipo assim,...
Oh, droga.
Eu tentei dizer algo legal, uma frase de efeito, mas não sei como continuar a conversa.
– Veja bem, se eu tivesse amigos, eu teria de me preocupar com eles, certo? Se meus amigos se machucassem, eu também sofreria, e se eles ficassem tristes, eu compartilharia da tristeza. Quando se vê a partir desse ângulo, esses pontos fracos continuam se acumulando. Assim, como humano, eu iria me tornar mais fraco.
– ...mas, se eles se divertissem, então você se divertiria também, e se eles estivessem felizes, você também estaria, onde se insere essa parte de tornar você mais fraco? Os pontos fracos se acumulam, mas o pontos positivos também, não é?
– Err...
Eu balancei minha cabeça em negativa.
– Eu fico com inveja quando amigos se divertem, e tenho ciúmes quando amigos estão felizes.
– ... ... Mas que mente pequena.
Hanekawa disse secamente.
Me deixa em paz.
– Se fosse da maneira que você me explicou, então tudo se anularia e nada iria mudar. Ter amigos e não tê-los seria a mesma coisa. Na verdade, como existem muitas coisas ruins nesse mundo... então, no final de contas, não resultaria em uma carga negativa?
– Não diga algo assim tão distorcido!
Retiro minha afirmação sobre você ser alguém com quem é fácil conversar.
A Hanekawa disse.
Eu fui uma oferta por tempo muito limitado... bem, quem se importa?
É melhor resolver esse tipo de mal entendido logo de cara.
– Sinceramente, eu gostaria de ser um vegetal.
– Um vegetal?
– Eu não teria de falar, nem de caminhar.
– Hmm...
Por enquanto, a Hanekawa acenou com a cabeça para o meu discurso.
– Mas isso ainda é querer ser um ser vivo, certo?
– Hã?
– O mais comum é as pessoas dizerem que querem ser algo inorgânico, como uma pedra ou um minério.
Tenho a impressão de que ela trouxe um assunto inesperado para nossa conversa.
Eu disse que queria ser um vegetal, uma planta qualquer, porque é isso o que eu realmente tenho pensado desde um bom tempo atrás, mas nunca pensei que meu desejo receberia uma objeção de quem o escutasse.
Hmmm.
Entendo... inorgânico, é?
Certamente, plantas também são seres vivos.
– Eu vou até a biblioteca agora.
– Hmm?
– Durante essa nossa conversa, comecei a ficar com vontade de ir até a biblioteca
– ... ... ... ... ...
Que linha de raciocínio ela seguiu?
Bem, ela disse que mais tarde ela vai voltar para casa ou algo do gênero... então ela provavelmente não tem nenhum plano pronto. Ela tem tempo livre, assim como eu, então ela o mataria zanzando pelo colégio ou indo até a biblioteca?
Essa pode ser a muralha que separa um aluno ignorante de um exemplar.
– Amanhã, já que é domingo, a biblioteca vai fechar, então eu tenho de ir hoje
– Hmmm...
– Você também quer vir, Araragi-kun?
– Por quê?
Sorri de maneira amarga.
Uma biblioteca.
Eu nem sequer sabia que essa cidade tinha uma.
– O que você vai fazer lá?
– Não é óbvio que vou estudar?
– 'Óbvio' você diz...
Desta vez sou eu quem está hesitando.
– Desculpa, mas eu não sou responsável o bastante para estudar por conta própria quando não se tem lição de casa para as férias de primavera.
– Mas ano que vem você terá os exames de admissão, certo?
– Exames, tanto faz... Eu duvido até mesmo de que vou me formar. Eu não vou conseguir de maneira alguma. No máximo, minha meta é não repetir no ano que vem.
– Hmmmm...
Hanekawa murmurou, como se estivesse entediada.
Eu não acho que ela quisesse que eu fosse junto.
Ela não disse mais nada.
Me pergunto.
Alguém tão educada quanto ela deveria ser mais fácil de entender.
Os sinais do semáforo continuavam alternando entre o vermelho e o verde.
Agora está vermelho.
Quando ficar verde, vamos nos separar, pense... pelo menos, esse seria o mais momento apropriado.
Hanekawa também devia estar pensando nisso.
Não é como se ela não conseguisse entender o que está implícito.
– Araragi-kun, você tem celular?
– Um celular? Bem, sim.
– Posso pegar emprestado?
Dizendo isso, ela estendeu a mão.
Eu não tinha certeza do que ela queria, mas resolvi obedecê-la. Peguei meu celular do meu bolso e entreguei-o a Hanekawa.
– Oh, é novinho em folha.
– Eu mudei de celular recentemente. Comprei um novo depois de dois anos, mas ele tem tantas funções agora que tenho a sensação de estar desperdiçando tecnologia por tê-lo.
“Não diga coisas tão deprimentes quando você ainda é tão jovem. Se continuar assim, quando crescer vai ser deixado pra trás pela nossa civilização. Se você não é bom com coisas digitais, você não consegue ter um dia-a-dia satisfatório”
– Certo, se chegar a esse ponto eu vivo recluso numa montanha. Daí quando a civilização ruir, eu retorno para a cidade.
– Quanto tempo, exatamente, você planeja viver?
'Você é imortal?' perguntou Hanekawa, perplexa.
No momento em que ela disse isso, Hanekawa começou a perscrutar meu celular.
Uma representante de turma dentre representantes de turma, e o retrato imaculado de uma aluna exemplar, mas naquele momento ela era somente uma estudante, e seus dedos pressionavam as teclas do telefone celular em um ritmo alucinante.
Meu aparelho não continha nenhum tipo de informação capaz de causar constrangimentos para mim, mas ainda assim... ... não se pode mexer no celular de outras pessoas desta maneira, sem pedir permissão!
Ou talvez ela suspeite que eu furtivamente tirei uma foto dela com a câmera do celular enquanto sua saia estava levantada?
Se for o caso, pode revirar o os circuitos do meu celular à vontade.
Eu adoraria me ver livre de uma suspeita tão escandalosa.
Se bem que ser uma garota deve ser difícil. Elas têm tantas coisas com que se importar. Se fosse um garoto e o zíper de suas calças estivesse aberto, ele poderia simplesmente insistir que estava tentando ser o Sexy Commando e funcionaria.
...Funcionaria, não é?
– Prontinho. Obrigada.
Hanekawa devolveu-me o celular.
– Não havia foto alguma, certo?
Eu disse; e Hanekawa
– Hein?
Inclinou a cabeça.
– Foto?
– Err...
Hã?
Eu entendi mal?
Então o que raios ela estava fazendo?
Hanekawa percebendo minhas dúvidas, aponta para o celular na minha mão, que eu ainda não guardei no bolso, e disse
– Coloquei meu número e e-mail aí.
– Quê?
– Mas que pena. Você acaba de fazer uma amiga!
E então.
Antes que eu pudesse dizer qualquer outra coisa, Hanekawa atravessou a rua... sem que eu tivesse notado, o sinal havia se tornado verde.
Eu já esperava que cada um seguisse seu caminho quando o sinal ficasse verde, mas ela tomou a iniciativa primeiro... Que? Ela não ia à biblioteca? Ah não, ela decidiu ir à biblioteca enquanto conversava comigo... não seria estranho se inicialmente ela estivesse indo na direção contrária.
Uma vez do outro lado da rua, Hanekawa virou-se para mim e acenou com um: "Até mais!".
Acenei de volta por reflexo.
Quando ela viu que eu havia respondido ao gesto (provavelmente acenando a mão como um imbecil), Hanekawa virou-se, entrou pela direita antes do portão do colégio e caminhou alegremente, e, no momento em que virou a esquina, perdi-a de vista.
Quando ela saiu do meu campo de visão, fui conferir meu celular.
Realmente, é verdade.
“Hanekawa Tsubasa” estava registrada na minha agenda.
O número de celular e o e-mail.
Eu nunca havia usado a agenda do celular. Recordo-me de todos os números que preciso, embora não esteja me vangloriando de minha memória. No máximo, memorizei os números da minha casa e dos celulares dos meus pais, então não é nada fora do normal. Quanto aos outros números, eu simplesmente olho o registro de chamadas.
E eu também não tinha amigos.
É por isso.
Essa “Hanekawa Tsubasa” seria a primeira pessoa a estar catalogada na minha agenda.
– O que é que ela tem?
A maneira que ela age está além da minha compreensão.
Amiga?
Amiga, ela disse?
Ela estava falando sério?
O estranho é, como pode uma garota em plena adolescência facilmente fornecer suas informações de contato para um garoto da mesma idade cujo nome ela conhece mas com quem ela acabou de conversar pela primeiríssima vez? Na verdade, talvez seja eu quem está desatualizado quanto a isso.
Não sei.
Porém... mesmo se eu não souber, há uma coisa que consegui entender.
Hanekawa Tsubasa.
Uma aluna exemplar dentre as alunas exemplares; uma representante de turma dentre representantes de turma.
Longe de fingir ser mais refinada do que é.
– ...Incrível, ela é uma pessoa legal.
Uma representante de turma dentre representantes de turma.
Hanekawa Tsubasa.
Um pouco depois disso tudo, durante as férias de primavera, eu iria me reencontrar com essa garota que passou por mim durante a tarde da cerimônia de encerramento, mas, naquele instante, eu não tinha como saber.
Não tinha a menor possibilidade de saber.
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